Voltar | Consumo

AssetFloow. Quão previsível é o comportamento do consumidor?

por Miguel Magalhães (Texto) | 4 de Janeiro, 2024

A AssetFloow recorre a inteligência artificial para prever o comportamento dos clientes dentro de lojas, mas têm a ambição de expandir a sua solução para além do setor do retalho.

Nos últimos anos, várias têm sido as startups a apresentar novas soluções para o setor do retalho, seja com a introdução de novos produtos, seja com a integração de novas tecnologias que permitem otimizar o processo de compra e venda em qualquer uma das suas etapas. Foi neste âmbito que Katya Ivanova Santos, CEO da AssetFloow, conversou com o The Next Big Idea para explicar como é que a sua plataforma pode ajudar retalhistas a ter um aumento significativo de vendas recorrendo a inteligência artificial.

Com uma carreira na consultoria de inovação e desenvolvimento de negócio, Katya chegou a Portugal em 2016 e depois de alguns anos como consultora independente, conheceu Ricardo Santos, CTO e cofundador da AssetFloow, que tinha fundado uma startup que analisava lojas físicas através de vídeo (a Heptasense). “Embora essas tecnologias sejam muito interessantes e sem dúvida que também estão a trazer valor, são precisas muitas autorizações na recolha de dados, são difíceis de escalar. Os retalhistas podem aplicar a uma loja, mas depois têm de utilizar os resultados de uma loja e tirar conclusões para as outras milhares”, explica. Juntos começaram então a pensar numa tecnologia diferente: o objetivo passava por criar uma solução que pudesse ser menos invasiva para o consumidor e que sem recorrer a sensores e outro hardware pudesse oferecer insights nos quais a maior parte dos retalhistas podia atuar.

Surgiu assim a ideia para a AssetFloow, um SaaS que pode ser integrado nos serviços de venda de cada loja e que recorre a algoritmos para fazer não só uma análise operacional a cada loja, como desenvolver simulações para estimar o impacto de determinados eventos (uma campanha de desconto, Black Friday ou o período de Natal). “Conseguimos perceber, por exemplo, quais são os percursos mais prováveis que um grupo de consumidores está a fazer dentro da loja. Conseguimos também dar uma estimativa de qual é o basket size e também a fazer heat maps para conseguirmos mostrar qual é a distribuição do fluxo em loja e qual é o valor por metro quadrado. Tudo para tornar a experiência do cliente a mais natural possível dentro da loja”, acrescenta a CEO da AssetFloow.

Escolher o cliente certo

O processo de integração da tecnologia em loja é relativamente simples. Numa primeira fase, as lojas partilham de forma segura com a AssetFloow os seus dados de vendas e, caso fiquem satisfeitas com os resultados apresentados, avançam para uma adoção a 100% da plataforma, funcionando como um plug-in aos sistemas já existentes. A partir daqui a AssetFloow fica com o acesso aos dados em tempo real e cabe ao cliente decidir que tipo de informações decide partilhar com a empresa, por exemplo, calendários promocionais. 

Atualmente, a solução da AssetFloow já está presente em cerca de 335 lojas, mas uma das primeiras lições que Katya e os seus cofundadores aprenderam foi a importância de escolherem bem os clientes que queriam abordar, nomeadamente em termos de literacia tecnológica. “No início, muitas vezes tivemos reuniões com retalhistas que quando nós pedíamos as informações necessárias para começarmos esta integração, não estavam preparados. Trabalhavam muito na base do Excel, não faziam a mínima ideia onde estavam colocados os produtos, era tudo muito confuso para eles e para conseguirmos ter esta informação passavam meses. Então, pensamos em fazer um estudo para perceber quais são as empresas que estão minimamente preparadas para começar a usar a nossa a nossa tecnologia, porque se eles não estão preparados, também não faz sentido falarmos sequer”, reitera a líder da AssetFloow.

A qualidade dos dados permite à empresa assegurar a eficácia dos seus algoritmos e utilizá-los para “atacar” um dos maiores problemas do setor do retalho: o desperdício alimentar. “O problema a nível global é mesmo gigantesco, é no valor de 1,75 biliões (trillion) de dólares”, reforça a empresária. Por isso, a empresa desenvolveu dois modelos principais – um mais vocacionado para o comportamento de consumidor e outro mais ligado à componente de forecast – que ao serem utilizados em conjunto permitem que as lojas possam ter uma melhor correspondência entre a procura por um determinado produto e o stock disponível do mesmo, em qualquer momento. 

  • Entre os melhores: A precisão de ambos os modelos ultrapassa os 99% e a AssetFloow comparou-os com os melhores algoritmos do mercado (Amazon, Google, Facebook), ficando a sua solução em primeiro lugar. Em breve, a empresa vai disponibilizar um whitepaper com os resultados.
  • O use-case mais comum? Varia de área para área dentro dos grandes retalhistas, mas tem sido sobretudo na vertente de simulação. Na área operacional, a tecnologia da AssetFloow tem sido utilizada para estimar o impacto do layout de uma nova loja. No Marketing, para simular o impacto de campanhas promocionais. Em Supply Chain, para a gestão de inventário em diferentes contextos.

Olhos colocados no futuro

Num ano complicado para as startups arranjarem financiamento, a AssetFloow, em março, levantou uma ronda de investimento de 1,5 milhões de euros. Por isso, uma das curiosidades sobre a empresa era perceber teria beneficiado, de alguma forma, da maior atenção que os VC deram a negócios baseados em IA. “Os prémios, os reconhecimentos, a nossa tecnologia inovadora e os nossos resultados ajudaram a que conseguíssemos o investimento”, recorda a Katya Ivanova Santos. Em 2022, a startup venceu o prémio de “Startup Mais Promissora” nos Entrepreneurship Awards e já este ano integrou a lista de “Hottest Startups Lisbon” da Wired. 

2023 foi para empresa um ano de crescimento, não só em termos de equipa, mas também para outros mercados, estando presente atualmente em quatro países – Portugal, Reino Unido, Itália e Brasil. No entanto, foi igualmente um período em que teve a oportunidade de repensar o seu modelo de negócio (subscrição anual, cujo preço varia de acordo com o número de lojas e métricas desejadas por cada cliente) e identificar outras oportunidades.

Por um lado, a empresa quer ter um contacto mais direto com marcas e não só com os retalhistas. Por outro, no âmbito dos seus algoritmos, a AssetFloow quer expandir-se para outras indústrias como os mercados financeiros, as telecomunicações ou o setor da energia. São setores que estão a investir cada vez mais dinheiro em soluções de IA e onde a AssetFloow pode abrir muitas portas se os seus modelos apresentarem resultados semelhantes. “Queremos tornar-nos num líder no mercado de forecast e de previsão do comportamento do cliente”, remata a CEO da startup portuguesa.