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Navegar na internet como a conhecemos pode ter os dias contados

por Gabriel Lagoa | 14 de Agosto, 2025

Uma nova geração de navegadores com inteligência artificial quer ir além de carregar páginas: querem ser assistentes que respondem a perguntas e resumem conteúdos em tempo real.

Terão os navegadores web atingido um ponto de estagnação? Durante largos anos, a experiência manteve-se essencialmente a mesma: abrir o Chrome, Firefox ou Safari, escrever um endereço e esperar que a página carregue. Esta simplicidade funciona, mas algumas empresas acham que pode funcionar melhor.

A inteligência artificial (IA) chegou aos navegadores, e há quem acredite que isso vai mudar a forma como usamos a internet. Em vez de simplesmente carregar páginas, estes novos browsers querem ser assistentes que percebem e respondem ao conteúdo que estamos a ver.

Os novos navegadores com IA

A mudança está a acontecer de várias formas. A Google e a Apple já adicionaram algumas funcionalidades de IA aos seus browsers, como ferramentas para revisão de texto e resumos automáticos de artigos, segundo o The New York Times.

Mas são as empresas mais pequenas que estão a tentar ir mais longe. O Dia, um navegador da Browser Company of New York, mostra uma abordagem diferente. Testado pelo jornal norte-americano durante uma semana, o browser tem um chatbot de IA que funciona ao lado de qualquer página web, permitindo fazer perguntas sobre o conteúdo sem sair da página.

Na prática, isto significa que o navegador consegue gerar resumos escritos de vídeos de 20 minutos sem que seja necessário vê-los, criar listas de artigos relacionados com notícias que está a ler, ou ajudar na revisão de textos.

“Devíamos poder simplesmente dizer ‘Estou a ver isto, tenho uma pergunta sobre isso’ e o sistema deveria conseguir responder e trabalhar por nós”, explica Josh Miller, CEO da Browser Company, citado pelo The New York Times. 

A empresa, fundada em 2019, já levantou mais de 120 milhões de dólares em investimento

Será o fim dos navegadores como os conhecemos?

Esta evolução coloca uma questão: ainda precisamos dos navegadores tal como são hoje? Um artigo publicado no Medium coloca a hipótese de, num futuro próximo, as pessoas obterem informações através de agentes de IA integrados no sistema operativo do computador ou telemóvel, substituindo assim a navegação web por ferramentas mais direcionadas para recolher informação. Um agente de IA é um sistema inteligente e autónomo que realiza tarefas específicas sem intervenção humana.

Mas esta ideia tem problemas práticos. Setores como o comércio online, entretenimento e redes sociais dependem de podermos explorar e comparar opções. É difícil imaginar como podemos comprar produtos ou usar as redes sociais sem uma interface visual.

A navegação web também transmite sinais de confiança: reconhecemos um site legítimo através do domínio, do certificado de segurança e de outras páginas. A IA pode complicar estes sinais em que dependemos para avaliar se a informação é segura.

Os problemas dos navegadores com IA

Estes novos navegadores têm limitações. Hoje em dia, todos os chatbots cometem erros ou inventam informações, um fenómeno conhecido como “alucinação”. Durante os testes do Dia, o The New York Times descobriu que o navegador por vezes dava respostas erradas, como negar a existência de promoções que estavam visíveis em certas páginas.

A privacidade é outra questão. Pedir ajuda à IA sobre uma página web significa que os dados podem ser partilhados com os modelos utilizados para gerar respostas.

Depois há os custos. Embora muitos destes navegadores sejam gratuitos no início, os modelos de IA são caros de manter. O CEO da Browser Company admite que o Dia vai introduzir subscrições entre 5 e centenas de dólares por mês, dependendo de quanto se usa a IA.

Há ainda o problema da sustentabilidade. De acordo com um estudo da Goldman Sachs citado pelo Público, uma consulta no ChatGPT, por exemplo, gasta 10 vezes mais energia do que uma pesquisa no Google, embora isso possa mudar à medida que o navegador for incluindo mais respostas de IA nos resultados das pesquisas. 

Quem dá mais?

É neste contexto que aparecem movimentos interessantes no setor. Esta semana, a Perplexity, uma startup que desenvolve motores de busca baseados em IA, fez uma oferta de 34,5 mil milhões de dólares para comprar o Chrome à Google.

Como conta a BBC, a proposta é vista mais como um “golpe publicitário” do que uma oferta séria, mas mostra como as empresas de IA veem o controlo dos navegadores como uma peça importante para o futuro da internet. Com 68% de quota de mercado segundo a Statcounter, o Chrome dá acesso a três mil milhões de utilizadores.

A oferta surge depois de o Departamento de Justiça norte-americano ter proposto que a Google seja forçada a vender o Chrome, na sequência de uma decisão dos Tribunais que considerou que a empresa mantém ilegalmente um monopólio na pesquisa online.

A própria Perplexity já lançou o seu navegador, chamado Comet, no mês passado, juntando-se ao Dia e outros projetos parecidos. Resta saber se os utilizadores estão dispostos a trocar a simplicidade atual por estas novas funcionalidades.