Musk quer rasgar acordo, o Twitter quer continuar. Afinal, em que pé está o negócio?
por The Next Big Idea | 11 de Julho, 2022
Elon Musk quer desistir da compra do Twitter. O motivo, alega, prende-se com o facto de a rede social não ter cumprido as suas obrigações contratuais do negócio. No entanto, a administração do Twitter tem outros desejos, nomeadamente a de prosseguir a venda pelo valor acordado: os 44 mil milhões de dólares.
De acordo com uma declaração apresentada à Securities & Exchange Commission (SEC, na sigla inglesa, a CMVM americana) na sexta-feira, dia 8 de julho, Musk considera que o Twitter não cumpriu com as obrigações acordadas e lhe forneceu informações “falsas e enganosas”. E, por isso, informou que quer e pretende desistir da compra. Sem avançar com os mil milhões de euros que prometeu pagar caso recuasse nas suas intenções iniciais.
A resposta do Twitter não se fez esperar e comunicou que não aceita esta versão dos factos: o acordo está em conformidade com a lei, pelo que o “negócio prossegue nos moldes acordados”. Basicamente, avisou: se Musk avançar e materializar a ameaça, o próximo encontro entre ambos será no tribunal e não numa mesa de negociações — e que vai lutar para o obrigar a desembolsar o montante na totalidade.
O que se segue: O caso deverá saltar para um tribunal do estado de Delaware especializado neste tipo de litígios comerciais, numa ação judicial que dará lugar a uma batalha legal mediática histórica. Pelos valores envolvidos, por se tratar de uma das maiores redes sociais do mundo, por envolver o homem mais rico do planeta.
O que deve acontecer: De acordo com a Axios, o Twitter deve conseguir reaver algum dinheiro. Afinal, há uma alínea no contrato da venda que dita que Musk tem de pagar mil milhões de euros caso viesse a desistir da compra. O que, pelo que parece, está a acontecer.
- No entanto, é pouco provável que consiga a totalidade dos 44 mil milhões de dólares. É um desfecho possível, com antecedentes, mas vai depender dos argumentos apresentados pelos advogados de ambas as partes no tribunal.
Mas por que razão quer Musk acabar com o acordo, se parecia tão entusiasmado “em transformar” o Twitter?
Desde que oficializou a compra, o sul-africano tem repetidamente dito e tweetado que o número de “bots” e contas falsas é na realidade bem maior do que aquele que o Twitter alegou ser quando chegaram a acordo. Por essa razão, decidiu, numa primeira instância, “congelar” o negócio para averiguar os números, mas agora quer mesmo recuar e rasgar o contrato.
- Por seu turno, o Twitter contrapôs esta ideia, explicando em comunicado que providenciou dados, inclusive internos e a que só a plataforma tem acesso, para que Musk avaliasse tudo a preceito. Por exemplo, lembrou os milhares de utilizadores que frequentam a rede social mas que não publicam nada — estas pessoas têm conta apenas para “leitura” assídua e apesar de teoricamente não contarem para a “estatística” dos utilizadores ativos, não são “bots” nem “contas falsas”, são humanos sem foto que querem “bisbilhotar” mas não se querem expor. Por esta e outras razões, o Twitter espera que Musk honre o acordo celebrado em abril. Isto é, que pague os 44 mil milhões de dólares.
O que alega Musk para travar o negócio: O homem forte da Tesla, na carta endereçada à SEC na semana passada, não vê as coisas assim e enumerou razões que o levam a pôr termo ao acordo sem ter de pagar os mil milhões de dólares estipulados no contrato inicial de compra.
- Além do número de “bots” e “contas falsas”, Musk alega que o Twitter terminou o vínculo com dois altos executivos, congelou contratações e avançou com despedimentos — tudo situações que violam o contrato de compra. Assim, no seu entender, foi o Twitter que quebrou promessas contratuais e não ele. Logo, não tem de pagar nada.
O que dizem os media: O multimilionário está a tentar fazer desta disputa acerca do número de contas falsas, embora a realidade é a de que Musk sabia deste facto de antemão. Ou seja, na verdade, está a cancelar o negócio porque as ações do Twitter valem consideravelmente menos do que aquilo que ele pagou por elas em abril. Noutros termos: pagou pela empresa mais do que aquilo que ela realmente vale.
- Além deste motivo, nos últimos meses, desde que anunciou a intenção de avançar com a compra, o impacto negativo tem alastrado para as ações da Tesla (em queda) — o que está a prejudicar a sua maior empresa e, por inerência, a fortuna pessoal, que está diluída em ações da fabricante de carros elétricos.
O que tudo isto significa para o Twitter?
Parafraseando a Axios, que fez um ponto de situação da rede social, após três meses de avanços, recuos e tweets de Musk, o Twitter como organização e serviço está “gravemente ferido”. Assim como a retórica feita durante o negócio (de que a rede social é essencial para um “mundo democrático”) por Jack Dorsey, cofundador, também parece esquecida. Agora, outros valores se levantam para os atores envolvidos.
Não é caso para menos. O Twitter enfrenta “a assustadora tarefa” de tentar combater judicialmente uma figura estratosférica em Musk enquanto tenta restabelecer a moral dos seus trabalhadores. (Afinal, estão num limbo há meses e estão na iminência de ter um patrão que não quer a empresa que os emprega.) Depois, há todo um novo rumo de negócio a pensar. O que não é uma missão fácil — de todo.
- As ações valem agora consideravelmente menos (37 dólares) do que aquilo que Musk concordou pagar em abril (54,20 dólares). E num cenário em que a empresa tenta encontrar um novo comprador, essa possibilidade pode ser apenas um problema em cima de outro problema: as novas políticas dos reguladores, que procuram combater fusões/compras de empresas poderosas, podem excluir e afastar muitos dos possíveis interessados — os únicos com recursos para pôr o Twitter nos eixos.
É por isso que a rede social vai avançar com um processo judicial contra Musk em tribunal para forçar a conclusão do negócio nos moldes acordados, isto é, nos 44 mil milhões de dólares. Para o o conseguir, a equipa de advogados vai acionar a Secção 9.9 do acordo celebrado entre Musk e Twitter (em que o termo “specific performance” pode decidir para onde penderá a decisão do tribunal).
- A esperança do Twitter assenta num caso judicial anterior (IBP Inc. v. Tyson Foods Inc.), que basicamente coloca Elon Musk no papel de Don Tyson, líder da multinacional Tyson Foods. Em 2001, o empresário tentou recuar numa aquisição acordada com a IBP, mas foi forçado a comprar a empresa pelo Tribunal do Comércio do Delaware — o mesmo que agora vai decidir se Musk vai ou não ter de pagar os mil milhões de dólares ou a totalidade do Twitter.
No entanto, não se deve descartar outro desfecho: há sempre a possibilidade de Musk e Twitter chegarem a um acordo.