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Klarna. A startup mais valiosa da Europa, que começou com uma amizade no Burger King

por | 16 de Junho, 2021

Klarna. A startup mais valiosa da Europa, que começou com uma amizade no Burger King

A Suécia, apesar de ser umas das seleções presentes no Euro 2020, arrisca-se atualmente a ver as suas principais empresas serem mais conhecidas do que os jogadores presentes no seu onze titular. Depois do IKEA (mobiliário), do Spotify (streaming), da Mojang (gaming), do Skype (plataforma de vídeo) e da Oatly (sobre a qual escrevemos aqui), a Klarna é a nova super-estrela da “equipa”. A fintech nórdica tornou-se na startup mais valiosa da Europa, após uma ronda de financiamento de 639 milhões de dólares que a avaliou em 46 mil milhões de dólares. O que torna esta empresa tão especial?

Tudo começou com hambúrgueres

Dois dos três fundadores da Klarna, Sebastian e Nikolas, conheceram-se num Burger King, ainda jovens, não num almoço de amigos, mas sim enquanto trabalhavam na cozinha a “grelhar carne” para juntar algum dinheiro. Levaram a sua amizade para a Faculdade de Economia de Estocolmo e foi aí que conheceram Victor, o terceiro membro da equipa original. Juntos, os três decidiram participar em 2005 (ano da criação da Klarna) na competição anual de empreendedorismo da sua universidade com uma visão inovadora: queriam que a sua empresa fosse a interseção entre os pagamentos, o shopping e a banca, desenvolvendo métodos de pagamento online mais simples para consumidores e vendedores.

Dado aquilo que sabemos, a expectativa seria que tivessem recebido uma salva de palmas no final da sua apresentação, no entanto, os três empreendedores obtiveram um “essa ideia nunca vai resultar” por parte de um júri descontente e ficaram em último lugar. A reação negativa e a pouca experiência que tinham em banca e finanças podiam ter sido razões para desistir, mas a paixão pela ideia fê-los continuar. Hoje em dia, bilionários, acordam certamente felizes com essa decisão.

BNPL vs Crédito Tradicional

BNPL é uma sigla que no último ano tem entrado cada vez mais no léxico do universo das fintechs e do ecommerce. Significa Buy Now, Pay Later (Compre Agora, Paga Depois) e está associada à oferta de serviços de financiamento para comércio online, na qual diversas plataformas se propõem a absorver grande parte do risco do lado dos consumidores. Como? Vamos por partes e utilizar a Klarna como exemplo.

Por norma, quando compramos algo online, o método mais comum de pagamento que é utilizado são os cartões de débito ou de crédito. No caso do débito, não existem comissões para consumidores e vendedores pagaram taxas reduzidas pela utilização de um serviço como a Visa ou a Mastercard. No caso do crédito, a situação é mais complexa: os comerciantes pagam uma comissão de transação maior e os consumidores acumulam (e pagam) os juros aos bancos, que por sua vez, depois pagam o serviço das empresas acima referidas.

Com a Klarna, as coisas funcionam de um modo diferente. O racional da startup sueca foi o de criar modalidades de financiamento mais acessíveis a consumidores, que os fizessem não só comprar mais vezes online, mas também ter uma despesa média maior por cada compra. Para isso, criou um serviço no qual os consumidores podem, por exemplo, escolher pagar o valor associado a um produto em quatro prestações ou 14 a 30 dias depois de o terem adquirido, sem qualquer tipo de juro associado. Então, onde é que a Klarna ganha dinheiro? Do lado dos comerciantes.

Com a sua plataforma/app, a empresa diz aumentar o número de compras para um comerciante em 30% e o valor médio gasto por compra a 34%. Por isso, cobra às lojas online uma taxa mais alta do que a Visa ou a Mastercard, pelo acesso aos seus utilizadores. Na construção deste ecossistema de lojas online, a Klarna tem-se focado especialmente na área da moda, onde as marcas precisam de maior volume de compras para serem rentáveis e onde cada vez mais consumidores substituem a experiência da loja física. Ao contrário daquele júri em 2005, alguns números indicam que o modelo de negócio da Klarna poderá resultar:

  • 90 milhões de consumidores no mundo inteiro
  • 250 mil comerciantes a utilizar o seu serviço
  • 2 milhões de transações por dia com a sua plataforma
  • Em 2020, teve 53 mil milhões de dólares em vendas onde o seu serviço foi utilizado e 1.1 mil milhões de dólares em receitas

Contudo, em 2020, a Klarna teve perdas de 1.3 mil milhões de dólares e os 639 mil milhões que recebeu de investimento vão ser utilizados para se expandir para mais mercados e atingir a escala necessária para tornar o seu negócio lucrativo.

O mercado e a concorrência

O boom do comércio online durante a pandemia, bem como uma certa desconfiança das gerações mais jovens nos bancos depois de sucessivas crises financeiras, foram dois fatores que beneficiaram o crescimento dos serviços de BNPL como o Klarna.

  • Nos EUA, já representam 2% dos pagamentos em comércio online (2020) e, no primeiro trimestre de 2021, cresceram 132% em volume face ao mesmo período do ano anterior.
  • Na Europa, já representa 7% de todas as transações em ecommerce e na Austrália este valor já é de 10%.
  • Na Suécia, a “casa da Klarna”, 23% das compras online já são feitas através de serviços BNPL.

Quem são os rivais da Klarna? Startups como a Affirm (EUA), a Afterpay (Austrália) e empresas do status quo como a Visa e a Paypal vão disputar com a fintech sueca um mercado que se espera que em 2025 possa valer 215 mil milhões de dólares.

Um senão do mercado BNPL: apesar de os serviços absorverem algum do risco, este não desaparece. Se os consumidores utilizarem estas plataformas para adquirir produtos que não conseguem pagar mesmo que seja em prestações ou 30 dias mais tarde, enfrentarão problemas semelhantes aos que encontram nos créditos tradicionais. Por isso, empresas como a Klarna têm o dever de garantir essa transparência, numa indústria que ainda não está muito regulamentada.