Há lojas online e as pessoas gostam de lá comprar. Mas no e-commerce tem de haver sapatos para vários pés
Ouve-se por aí que o mundo está a mudar. Mas, mais do que ouvir-se, a mudança vê-se. Nomeadamente na mudança dos espaços físicos para essa grande loja que chega a todos: a Internet.
Vamos por isso falar de de e-commerce e inerentemente de marketing digital. Filipe Aparício, da We Know You, ajuda diariamente as marcas e startups a crescerem através de design thinking e planeamento estratégico. “Como fazemos um bocado de tudo, somos um canivete-suíço para quem trabalha connosco”, diz.
E como vai a relação dos consumidores com o marketing digital, hoje em dia? “Como consumidores, já estamos habituados a filtrar o conteúdo que se torna repetitivo e massudo, [aquele] que estamos habituados a ver em demasia das marcas que querem criar uma venda e acabam por tentar todos os caminhos possíveis para chegar a nós”, começa por explicar.
“E nós, de forma quase orgânica e automática, começamos, por exemplo, a apagar os emails sem lermos o que lá está. É mais do mesmo. Ou quando chegamos de manhã ao carro e temos o pára-brisas cheio de folhetos e nem olhamos para o que é. Deitamos fora, esquecemos aquilo e seguimos em frente. É simplesmente ruído para nós. Enquanto consumidores não utilizamos esse tipo de informação.”
Achamos que simplesmente estar a bombardear promoções, descontos, todo o tipo de botões grandes e pop ups se torna um processo um bocado abusivo por parte da marca
Com isto, “sentimos que raramente as marcas compreendem as nossas necessidades enquanto consumidores. É o dilema de quantidade versus qualidade. Achamos que simplesmente estar a bombardear promoções, descontos, todo o tipo de botões grandes e pop ups se torna um processo um bocado abusivo por parte da marca”, explica Filipe.
Mas é preciso ajudar as marcas a ultrapassar a situação, para que o investimento feito no online seja rentável. “Temos de ver como conseguimos utilizar formas mais inteligentes para ajudar as marcas com qualidade em vez de ser com quantidade. Podemos ter imensas visitas no site, mas a taxa de conversão vai continuar a cair porque estamos a ser ignorados perante as nossas audiências e consumidores”.
Para melhorar esta relação ajuda muito um perfil do consumidor. Mas um perfil real e verdadeiramente ajustado. “É importante perceber qual é o percurso do consumidor. Temos de perceber porquê que veio ter connosco e como é que conseguimos convertê-lo. Temos de perceber o que quer ver na nossa marca. Depois é importante ver a motivação do consumidor. Através da ação podemos ver o que o consumidor fez para chegar até nós. Perguntou ao amigo, viu um anúncio no Google, leu num artigo que organicamente viu nos resultados, viu um post nas redes sociais. Temos de perceber isso numa primeira fase”.
Esta análise permite que as lojas saibam quem são os seus clientes. E, se cada caso é um caso, pois que sejam tratados como tal: pessoas únicas. “Eu costumo utilizar uma analogia que é a do sapato”, exemplifica Filipe. "Existem vários números de sapatos, como é obvio. Se só vendessem um número, quase ninguém comprava. Vendiam aquele número a um determinado grupo de pessoas, mas havendo mais números conseguimos atingir mais pessoas. Aqui é exatamente o mesmo. É uma pena estarmos a comunicar a mesma coisa para toda a gente quando isso não vai funcionar com todos. Temos de comunicar de forma personalizada e não massificada, como se fazia antigamente. Sem haver esta revolução e esta adoção de tecnologias mais inteligente e mais personalizadas vai ser difícil as marcas atingirem os seus objetivos”, remata.
Portugal é um país difícil para o e-commerce, mas há esperança. A diferença está nos detalhes
É sobre captar novos clientes que se debruça Christophe Matos, da Kwanko, uma empresa que se dedica à gestão de campanhas publicitárias online.
“Vender em Portugal não é fácil, de todo. É um país um pouco atípico. Temos a particularidade de ter shoppings abertos até à meia-noite, sábados e domingos. Esta particularidade acaba por limitar muito o e-commerce e vender online em Portugal é, às vezes, uma missão um pouco mais complexa”, começa por referir.
“A LaRedoute era um catálogo, hoje é a farmácia para mulheres cada vez mais jovens que quando estão maldipostas compram sapatos e fica tudo bem
Contudo, há esperança. E é com humor que dá um exemplo que espelha bem a realidade portuguesa. “A LaRedoute era um catálogo, hoje é a farmácia para mulheres cada vez mais jovens que quando estão maldipostas compram sapatos e fica tudo bem. Esse efeito é o que faz a diferença. Todos temos a missão de fazer com que a compra seja uma experiência boa, com um sentimento especial”.
Por isso, é preciso olhar para os desafios diários do e-commerce. “Existem objetivos específicos: aumentar a base de dados, as vendas, ter mais clientes, aumentar a qualidade do cliente”. E, claro, é preciso que as páginas estejam pensadas de maneira a que os clientes queiram ficar por lá: têm de se sentir “em casa”.
Não falando na analogia dos sapatos, Christophe concorda com Filipe, deixando uma máxima que resume bem a ideia anterior: “Retail is detail”. Apesar das prováveis “dores de cabeça” devido aos vários tipos de clientes e às inovações que vão surgindo, “a soma dos detalhes faz a diferença no final. A paixão de ir ao detalhe em tudo é que faz com que a loja tenha sucesso”.
“Temos de ter os nossos sites pensados e afinados ao milímetro”, diz Christophe Matos. E já lá vai o tempo em que se olhava primeiro para o desktop. Agora a realidade é, sem dúvida, “mobile first”.
“Quando se pensa numa página já chegou a altura de pensar primeiro no mobile e depois nos outros casos. O nosso problema é que trabalhamos em ambiente desktop e se calhar não pensamos nisso, vamos sempre otimizar primeiro a versão desktop. Às vezes são coisas muito básicas”, afirma.
“Um botão verde funciona melhor do que um vermelho; está testado, não há volta a dar. Essas coisas simples rentabilizam investimentos
E existem regras simples que têm de ser cumpridas, para que tudo funcione devidamente e o cliente tenha a melhor experiência possível. “Um botão verde funciona melhor do que um vermelho; está testado, não há volta a dar. Essas coisas simples rentabilizam investimentos. Temos mais qualidade se os formulários tiverem mais campos, também. A nível de imagens, temos de pensar e de tentar orientar o utilizador para o que lhe interessa ou para o que nos interessa a nós que ele veja”.
No caso das páginas de moda, os exemplos são flagrantes. “Já vi testes de páginas em que cortam a cabeça aos modelos. Quando têm uma cara muito expressiva a zona de calor está na cara e não na roupa. O primeiro site da Zara era assim. Mas com isto perdia um pouco de humanização. Agora têm a foto completa, mas os modelos não são tão expressivos. O fogo tem de estar na roupa, mas tem de haver um lado humano. A soma dos detalhes faz a diferença. Tem de haver personalização, tem de ser tudo muito bom”. Afinal, é só assim que aumentam as vendas.