Masterclass com Miguel Santo Amaro: O que faz um bom pitch?

por The Next Big Idea | 24 de Março, 2023

O nome de Miguel Santo Amaro ficará ligado para sempre a uma das startups mais conhecidas de Portugal, a Uniplaces. Hoje, dedica a maior parte do seu tempo à Coverflex e é também investidor da Shilling. A experiência nos dois lados da “barricada” dá-lhe uma visão sem par sobre o que constitui um bom pitch que, reitera, não é diferente de uma qualquer venda comercial. E se é certo que não há propriamente uma ciência por detrás do pitch perfeito, há dicas várias que aumentam a probabilidade de sucesso.

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Empreender é 99% esforço

Portuense em exclusivo até aos 18 anos, Miguel Santo Amaro é um cidadão do mundo. De Inglaterra aos EUA, passando pelo Bangladesh e China, escolheu Lisboa para lançar o negócio que o colocou — a si aos restantes fundadores da Uniplaces — na génese da construção de um ecossistema de empreendedorismo em Portugal.

A sua formação de base é Finanças e o especial interesse por empreendedorismo social levou-o a Dhaka para tentar perceber melhor o conceito de microcrédito. No entanto, o que encontrou na prática “deturpou quase toda a conotação positiva” que tinha sobre o mesmo. A passagem pelos EUA despertou-o para o empreendedorismo tecnológico, e é por lá que conhece Jack Ma, fundador da Alibaba, “antes do Jack Ma ser a figura que é hoje”, o que o faz rumar para Hangzhou, “três ou quatro anos antes da IPO da Alibaba”. “Na altura não havia google translate”, brinca, dando conta de um ano “difícil”, mas de enorme aprendizagem.

É nestas voltas pelo mundo que conhece Mariano Kostelec e Ben Grech, os seus co-fundadores na Uniplaces. O que os unia? “Curiosidade e ambição”, responde Miguel Santo Amaro. A vontade de criar algo disruptivo levou-os a uma sabática de três meses em Viana do Castelo, um “acaso feliz” — “Era a casa dos meus pais, o que nos permitiu ficar com custos reduzidos”, partilha.

A Uniplaces não foi uma “epifania”, antes a resposta para um problema muito concreto que lhes foi apresentado por um amigo de Miguel Santo Amaro que, à data, era presidente da associação de estudantes da Faculdade de Medicina de Lisboa e que procurava uma forma de facilitar aos colegas a procura por alojamento na capital.

O “product market fit” garantiu-lhes a tração inicial e ditou que fosse este o projeto a que se viriam a dedicar, mesmo face “a outras duas ideias que, na altura, nos pareceram mais interessantes”. Afinal, “a graça da inovação acaba por vir de não escolhermos os problemas que queremos atacar”, reconhece.

Ainda que não exista propriamente uma “fórmula para o sucesso do empreendedorismo”, parte do processo pode ser ensinado e haverá, certamente, alguma queda natural para o negócio que ajude. Ainda assim, no final do dia, “99% é esforço”, assegura Miguel Santo Amaro, que é hoje, além de empreendedor, é investidor.

Assim, juntou-se à Shilling em 2016, porque queria ser um empreendedor “mais completo”, escolhendo uma venture capital com quem já tinha história para dar esse passo — “não só fomos [a Uniplaces] a primeira participada deles, como eles foram o nosso primeiro investidor”, conta. Atribui a decisão também à vontade de “retribuir” aquilo que recebeu quando ele próprio estava a dar os primeiros passos. “Tento fazer [como investidor] o que eu como empreendedor gostava de ter do outro lado como investidor”, resume.

O que faz um bom pitch?

O pitch está entre as atividades mais recorrentes da vida de um empreendedor e sumariza-se no discurso — bem estudado — que este usa para apresentar a sua startup ou produto, de forma a convencer quem o ouve a investir, aderir ou comprar. Por esse motivo, Miguel Santo Amaro diz que o pitch em nada diferente de “uma venda comercial”, mesmo quando se tem pela frente um investidor.

Não há propriamente uma ciência por detrás do pitch perfeito, mas há dicas várias que ajudam a um maior sucesso no momento da apresentação — a começar pelo “fundamental” estudo prévio.

“É importante definir o tipo de sócio que queremos e identificar bem com quem estamos a falar”. Depois, “garantir que a mensagem é clara, simples, coerente e ajustada”. Por fim, respeitar a trilogia da apresentação: “a combinação entre equipa, mercado e produto”. “Isto é fácil de dizer, mas bastante complicado de fazer com que corra bem”, não esconde Miguel Santo Amaro.

E mesmo considerando a velha máxima do fake it until you make it [finge até conseguires], o bom senso deve imperar e o pitch “deve estar adequado ao estágio da empresa. Portanto, quando estou numa fase inicial, a vender um conceito, um powerpoint, provavelmente devo focar-me na experiência da equipa, em explicar o porquê de ser aquela equipa e o porquê de ser agora”. Isto porque “um bom mercado” acaba por ser, muitas vezes, o fator determinante na decisão: “uma boa equipa com um bom mercado acaba por conseguir fazer evoluir um produto da forma certa”, resume. Ainda que “um excelente produto seja interessante, uma excelente equipa com um excelente mercado podem fazer evoluir o produto certo para o problema certo”, reitera.

Ter capacidade de criar empatia com quem se está a falar e, se possível, mostrar o feedback de clientes sobre o produto em causa faz toda a diferença, assim como escolher as métricas certas para provar um ponto. Questionado sobre o “número ótimo” de slides para uma apresentação, Miguel Santo Amaro diz que “quantos menos melhor”, mas estará algures entre os 12 e os 20. E depois de três anos em que os encontros remotos se tornaram quase regra — ou atingiram um estatuto de normalidade —, o empreendedor que é também investidor lembra que à distância de um ecrã é sempre mais difícil “ler” a pessoa com quem estamos a falar. “Muitos dizem que é mais difícil divorciar-me do meu investidor do que da minha mulher”, brinca, portanto “provavelmente quero mesmo conhecer a pessoa com quem o estou a fazer”, resume.

O que mudou em dez anos de empreendedorismo em Portugal?

O empreendedorismo em Portugal “começou muito antes da Uniplaces”, mas o facto é que à data pouco se falava de startups e menos ainda de unicórnios. Hoje, Portugal conta com pelo menos sete empresas com uma valorização acima dos mil milhões de dólares, o que à luz da dimensão do país parece quase “desproporcional”. No entanto, isto é apenas reflexo do muito que mudou o ecossistema de empreendedorismo nacional numa década. Hoje “temos referências” e “há várias pessoas em Portugal a quererem ser os ‘Cristianos Ronaldos’ da tecnologia”, diz Miguel Santo Amaro. Esta mudança de paradigma, na forma como se encaram empresas tecnológicas com enorme potencial de escalabilidade faz com que hoje seja bem mais fácil convencer um jovem que está a sair da universidade a iniciar a sua carreira profissional numa startup.

Miguel Santo Amaro, que não tem dúvidas do “potencial” português, reconhece que faltam exemplos de empresas que vinguem em B2C, para que a marca Portugal fique associada a nomes com reconhecimento global, como já acontece com Espanha ou Israel.

Mas lá chegaremos, assevera.

O que é a Coverflex?

Em 2019, os fundadores da Uniplaces viram-se confrontados com uma de duas opções: levantar mais capital e por 4/5 anos trabalhar para crescer em valorização de mercado ou contratar um CEO que desse a volta ao negócio de forma a torná-lo lucrativo. Vingou a segunda hipótese. Assim, viram-se libertos para abraçar novos desafios, e Miguel Santo Amaro não foi exceção.

A Coverflex nasce da junção entre Miguel, Rui Carvalho, Tiago Fernandes, Luís Rocha e Nuno Pinto e da visão de se tornarem “o banco das pessoas”.

E o que é a Coverflex? Uma solução que permite às empresas, através de uma única plataforma, disponibilizar aos colaboradores, num só cartão, o valor correspondente a benefícios flexíveis, cartão de alimentação, seguros e descontos. Todo este “saldo” pode ser utilizado pelo colaborador de forma simples, tal como se utilizasse um cartão de débito, sendo a plataforma capaz de identificar o prestador de serviço e definir se o valor gasto em cada transação deve ser descontado do saldo do cartão de alimentação ou do saldo destinado a outros benefícios. Acresce a isto um conjunto de vantagens que a própria Coverflex oferece. A solução é ainda fiscalmente compensadora tanto para as empresas como para os colaboradores.

O nova empresa de Miguel Santo Amaro nasceu em plena pandemia e hoje conta já com mais de 2500 clientes em Portugal, com planos para expandir a nível internacional no curto prazo.

Especial Únicos

O projeto “Únicos” propõe-se dar resposta à pergunta sobre o que torna uma empresa única e de que forma essa aprendizagem pode ajudar outras. Fizemo-lo num projeto em parceria com a Google e a Shilling que se divide em três iniciativas:

  • Uma série de televisão na SIC Notícias e na SIC Internacional, cuja estreia aconteceu a 2 de outubro e cujos episódios pode rever aqui;
  • Um conjunto de masterclasses com fundadores de startups portuguesas que se tornaram globais, onde estes partilham o seu percurso e aprendizagens, que pode encontrar aqui;
  • O Prémio “Únicos, que apoiará com mais de 150 mil euros (entre investimento e serviços Google) uma startup que possa vir a integrar esta nova geração de empresas portuguesas que são líderes ou candidatas a líderes nos mercados globais onde atuam.