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António Câmara: “Há várias formas de lidar com o fracasso. A pior de todas é ter pena de si próprio e eu nunca tive pena de mim próprio”

por | 5 de Fevereiro, 2021

António Câmara: "Há várias formas de lidar com o fracasso. A pior de todas é ter pena de si próprio e eu nunca tive pena de mim próprio"

É um nome incontornável quando se faz o retrato das últimas décadas, em Portugal, no que respeita a inovação e empreendedorismo. António Câmara, académico, investigador, empresário, foi fundador da Ydreams, empresa com que conheceu a glória do sucesso e as amarguras do fracasso, e que o tornou habilitado como poucos a pensar sobre os fatores críticos de inovação.

O professor-empresário considera que o mercado tem puxado mais pela inovação do que as universidades, até porque o estímulo ao nível da academia é curto ou inexistente – “as pessoas que fazem as empresas em muitos casos estão em posições já muito confortáveis na carreira docente ou são loucas”. Essa falta de estímulo, afirma, faz que sejam muito baixa a percentagem de empresas fundadas na universidade por professores, ao contrário do que acontece em ecossistemas mais maduros e oleados.

Isso não significa, no que lhe diz respeito, que tenha desistido desse caminho. Pelo contrário. 2021 é o ano em que espera lançar um novo projeto com o qual quer “transformar o mundo no nosso bairro” e combater as gigantes tecnológicas com uma outra visão.

Numa entrevista no âmbito da rubrica “Ideias para 2021” que resulta de uma parceria entre o The Next Big Idea e a Casa de Investimentos, António Câmara partilhou ideias sobre tecnologia, inovação, gestão e visão sobre os poderes em jogo nesta segunda década do século XXI. Um mundo onde não quer que a Europa desista de liderar: “Eu não aprecio ser servo e ter algoritmos que mandam em mim”.

Atendendo que é um dos nossos primeiros cientistas empreendedores, está hoje convencido que as universidades são melhores do que o mercado a puxar pela inovação ou mercado é mais eficiente a fazer esse papel?

Depende das universidades. Algumas a nível mundial têm um impacto na inovação imenso, como o MTI, Stanford, Cambrige, ETH Zurique … Se olhar para Portugal, eu acho que a Universidade nos últimos 15 ou 20 anos se fechou muito sobre si própria e as startups têm um papel muito mais importante a levar os produtos para o mercado. É óbvio que algumas startups vêm de universidades, mas a ligação não tem muito a ver com a política estratégica das universidades. E nós vemos isso pelas nossas empresas. Muitas das empresas que se afirmaram pela inovação beneficiam da proximidade à universidade, mas foi o mercado que puxou por elas.

Não há nenhum estímulo na universidade portuguesa para um professor se tornar empreendedor

Hoje há muito mais pessoas da academia a terem as suas próprias empresas. Como é que olha para esta evolução?

É uma evolução positiva, mas não é tão marcante quanto isso. Na área de investigação é mais natural. Mas na área docente todo o quadro de promoções docentes atribui um peso ínfimo à parte do empreendedorismo. O peso é na performance científica, na parte escolar, e para aí 5% para todas as outras atividades. Não há nenhum estímulo na universidade portuguesa para um professor se tornar empreendedor.
O que acontece no caso de muitos investigadores é que eles sentem o potencial para chegar ao mercado, em muitos casos o futuro profissional deles depende desse risco. Mas não há nenhuma medida estrutural na universidade portuguesa como existe no MIT, em que 20% dos professores cria empresas. A percentagem de professores que cria empresas em Portugal é para aí 1%. E não há nenhum estímulo nesse sentido. Portanto as pessoas que fazem as empresas em muitos casos estão em posições já muito confortáveis na carreira docente ou são loucas.

Há 20 anos não era melhor. O que é que o levou a si a dar esse salto?

Em 1998/1999, fui professor visitante no MIT, e um luso-americano chamado Kevin Teixeira tinha visto o nosso trabalho em Portugal e disse-me: “António, tu tens uma enorme hipótese com a Conservation International (cujo presidente era o Harrison Ford) de fazeres a visualização dos fogos na Amazónia. E vão pessoas da Conservation International ao MIT, vão-te ouvir e vão ouvir a equipa do MTI Media Lab”. E eu fiz a apresentação e a seguir vem o MIT Media Lab com a pessoa que fez os efeitos especiais do Titanic. Fui absolutamente cilindrado. Olhei para aquilo e pensei: “Eu não tenho a mínima hipótese de competir com estes tipos se continuar na Universidade”.
E criámos a empresa justamente para isso, para ser competitivo. Para chegar lá e não apresentar algo académico patético, perante um mundo que trabalha com o tipo que ganhou 10 Óscares de Hollywood. E foi o brio: “Eu não posso ir para fora e fazer esta figura, isto é patético”. E nós fizemos a firma e a primeira pessoa que contratámos foi um designer! Esse foi o grande motor.

Nestes 20 anos, quantas patentes é que registou?

A YDreams deve ter registado 70 ou 80 patentes. Eu registei entre 15 a 20. Hoje temos uma empresa, que é a Ynvisible, com potencial enorme. Essa já não é bem portuguesa, esse é um dos problemas que aconteceu. Mas provavelmente é uma das firmas que mais patentes regista. E nós não registámos mais por causa do custo.

Já vendemos à volta de 5 patentes, uma delas à Uber

Ter patentes é um marco importante para quem está a trabalhar numa área que tem de ser de liderança em termos de inovação?

Uma das coisas que nos salvou foi conseguir listar as empresas em bolsa. Para isso temos de ter liberdade de operar e a liberdade de operar significa que não estamos a infringir patentes de outros. O segundo ponto é que as patentes têm valor, nomeadamente no mercado americano. Aquilo que nos salvou também foi o facto de num dado momento de crise total, nós podermos vender patentes. Já vendemos à volta de 5 patentes, uma delas à Uber. Agora, as patentes têm um custo e no sistema contabilístico português não são ativos. No mercado americano são, fazem parte dos bens de capital. Se uma pessoa tem uma visão global ter patentes é decisivo.

Para as nossas startups, nomeadamente nas áreas tecnológicas, esse é um caminho no qual deviam apostar apesar das dificuldades?

Sem dúvida. Porque se não, não têm hipótese. Quando se chega a um mercado como o americano ou o alemão, se não tiver patentes estamos liquidados. E nós temos o reverso: tivemos uma firma que foi liquidada, porque houve um caso em tribunal, por supostamente termos infringido uma patente e perdemos. Eu tenho a experiência completa… Portanto patentes é algo que custa, mas é fundamental em áreas em que é determinante.

__A YDreams é uma empresa que ficou associada ao trajeto português nesse campo nos últimos 20 anos e teve um bocadinho de tudo. Esteve listada em bolsas internacionais: Toronto e Frankfurt …

E agora está com a Ynvisible e a YDX também em Toronto e Frankfurt.

O pior erro que nós fizemos foi crescer em áreas não estratégicas e crescemos vítimas do nosso próprio sucesso

Portanto tiveram exposição internacional, boas reviews nos principais meios que cobrem temas de inovação e de tecnologia, e um percurso que é associado à inovação em Portugal. Ainda assim a YDreams não correu bem e a certa altura vocês tiveram de enfrentar um processo que seria impensável 10 anos antes. Hoje seria diferente?

Hoje seria claramente diferente. Nós tivemos uma fusão com uma empresa israelita de realidade aumentada que falhou no último minuto – a empresa hoje é da Apple. E tivemos a venda da Ynvisible, que falhou no último minuto. Tivemos duas vendas falhadas e enfrentámos uma crise com 180 pessoas. O pior erro que nós fizemos foi crescer em áreas não estratégicas e crescemos vítimas do nosso próprio sucesso. Tivemos imensa procura e depois há um dia em que vem a crise e enfrentamos o muro. E depois os custos de emagrecimento são brutais.
Além disso, e isso não é desculpa, o nosso investidor também faliu [o principal investidor da Ydreams nessa data era o BES]. Tivemos 4 acontecimentos: a crise, duas vendas falhadas e o investidor ter falido. Depois miraculosamente conseguimos pessoas que acreditaram em nós na Alemanha e no Canadá, e começámos a dar a volta, que ainda não está completa, mas está muito próxima.

A convicção de que há um produto certo e que de facto faz a diferença é algo do qual não se deve abrir mão mesmo quando as coisas estão a correr mal?

Uma das razões pelas quais nós não desistimos é que nós em 2010 éramos a melhor firma do mundo em realidade aumentada, a longa distância das outras. A pessoa do Windows e do Adobe Acrobat disse-nos e aos nossos investidores: “Estes tipos vão poder ser a Adobe um dia”. Aquilo que nos permite ainda hoje lutar é que achamos que conseguimos competir num mercado decisivo e ganhar ainda. Portanto o que nos aguentou durante estes anos é nós conhecermos todos os tipos que estão no mercado e sermos melhores do que eles. Precisamos de uma layer de gestão, mas hoje sabemos onde ir buscá-la. A Ynvisible tem o diretor de operações que foi o diretor de inovação da L’Oréal nos Estados Unidos, tem um CEO finlandês que é do melhor que há, tem tipos americanos que são do melhor que há na gestão. Nós na altura devíamos ter feito isso, é óbvio!

O que aconteceu e foi determinante é que Portugal passou a ser um país incrivelmente atrativo

O que mudou de então para cá?

Eram outros tempos e não era tão fácil. Mas eu acho que o que aconteceu e foi determinante é que Portugal passou a ser um país incrivelmente atrativo. Hoje as pessoas adoram vir trabalhar para Portugal. Uma das principais firmas do mundo de realidade virtual veio no auge da crise de Londres para Lisboa. Isto era impensável há uns anos. E o que acho que aconteceu é que as pessoas perceberam que podem fazer tudo a partir de aqui e que é um país fantástico para viver e barato. Eu sempre achei que Portugal era um país fantástico, mas essa perceção não existia no exterior. Hoje existe e isso é decisivo. Temos imensos estrangeiros a trabalhar em Lisboa.

Vocês criaram produtos que hoje dá vontade de dizer que foram antes do tempo. Na área da realidade aumentada em 2006 tinham uma visão muito própria de como é que podiam fazer a diferença. Passaram 14 anos. Ainda não aconteceu essa promessa?

Nós fomos a primeira firma no mundo que introduziu elementos virtuais em cenas reais e percebemos que se tinham de detetar as colisões, olhar para as oclusões, e projetar sombras. Temos a patente original que é citada por toda a gente e infringida por outros. E ganhámos o primeiro prémio na primeira conferência do mundo de realidade aumentada por causa disso, porque entrávamos no filme e interagíamos com o filme. O que se passa é que a Apple e o Google hoje em dia têm isso.
Nos últimos 3 anos o que nos perguntámos foi: “Como é que podemos ganhar a estes tipos ainda? Para onde é que eles não estão a olhar?”. E nós vamos apresentar isso [à data desta entrevista, antes da decisão de novo confinamento, estava previsto para 19 de janeiro].

O que a Apple vai fazer é: eu estou a ver um programa na Apple TV e vou poder comprar tudo o que estou a ver. E nós que estamos numa visão completamente diferente que é transformar o mundo no nosso bairro

Vamos ter novidades?

Temos novidades brutais, num projeto fantástico que tivemos o privilégio de fazer, em que nos recriámos e vimos algo que eles não estão a ver ainda. Porque conhecemos as pessoas que estão nas equipas deles todas. E eles têm uma agenda e o que vão fazer é transformar o mundo numa loja. O que a Apple vai fazer é: eu estou a ver um programa na Apple TV e vou poder comprar tudo o que estou a ver. E nós que estamos numa visão completamente diferente que é transformar o mundo no nosso bairro.

Isso significa o quê?

É combater todos os gigantes americanos no local. Como é que vamos conseguir preservar os nossos bairros? Como é que vamos preservar as lojas dos bairros? Como é que elas vão conseguir competir e triunfar, algumas delas até globalmente? E como é que nós vamos conseguir ter em conta que o mundo não é só economia? Como é que vamos dinamizar a economia circular? Criámos todo um sistema que utiliza a realidade aumentada, mas que olha para as cidades de uma forma completamente diferente, em que esta micro-georeferenciação, que foi sempre o nosso forte, entra, mas onde entram novidades que nós vamos apresentar agora.

Como é que vocês perceberam que podiam voltar e fazer a diferença?

Temos duas vantagens enormes. Uma delas foi a total falta de foco. E como tivemos falta de foco fizemos 2 mil projetos no mundo inteiro de realidade aumentada, em todas as áreas possíveis e imaginárias, onde aprendemos imenso. Aprendemos aqui em Portugal, no Brasil, no Canadá, no mundo inteiro. Mas depois percebemos que aquilo é uma visão limitada. Tivemos a falta de foco, mas é bom ter a perspetiva.
Eu estive envolvido num grande projeto: o Sistema Nacional de Informação Geográfica. Vinham cá pessoas de todo o mundo impingir-nos os sistemas e veio uma vez um francês que me disse: “o mundo é desta forma e nós franceses temos a forma de o representar matematicamente ideal”. E na altura olhávamos para bases de dados relacionais e achávamos que o mundo ia ser todo diferente, aquela coisa francesa ultrateórica… E quando nós estávamos a pensar neste mundo eu lembrei-me desse francês e disse: “ele tinha toda a razão”.
Todo o nosso sistema é baseado num conceito matemático, que é o hipergrafo, que mimetiza o mundo real. E o que fizemos foi repescar isso e dizer: “isto vai dar uma estrutura completamente diferente”. Esta constatação de que temos de modelar o mundo de forma diferente é incrivelmente importante porque é a base de tudo.

Qual é que é o seu nível de entusiasmo com isso neste momento?

Total. Não durmo. Porque acho que conseguimos entusiasmar várias pessoas no mundo e que vai ser um choque. Não é fácil comunicar, por isso temos trabalhado muito na comunicação a vários níveis, porque é muito abstrato. Mas ao mesmo tempo acho que as pessoas um dia perceberão.
Temos uma experiência incrível com a drogaria Santo Amaro [risos], que é basicamente pegar numa loja de bairro e dizer assim: “Como é que esta loja vai ser o maior sucesso do mundo?”. Porque tem um senhor de 83 anos, o Senhor Antunes, que sabe tudo sobre produtos de drogaria! Eu acho que ninguém no mundo sabe tanto como ele. Portanto nós começámos a pensar que havia várias lojas destas em Portugal que teríamos de preservar e em como é que podíamos levar isto para o mundo.

A drogaria de Santo Amaro é o vosso piloto?

É um dos pilotos.

Com um senhor de 83 anos?

Sim.

Porque é que a Nokia e a Ericsson falharam? A razão é sempre igual: a partir de uma certa altura não há capital suficiente nos países e vêm os fundos internacionais que mudam a gestão

A ciência exige tempo e espaço para se poder errar. Mas quando se tem uma empresa tem-se uma urgência diária. Como é que se vive com essas duas pulsões?

Eu acho que são mundos separados. A vantagem da ciência é poder errar e eu acho que tem de estar próxima das empresas. Porque é que a Nokia e a Ericsson falharam? A razão é sempre igual: a partir de uma certa altura não há capital suficiente nos países e vêm os fundos internacionais que mudam a gestão e a primeira coisa que a gestão muda é a razão pela qual a Nokia e a Ericsson foram extremamente bem-sucedidas. E essa razão era a política de skunk works, que dava a possibilidade às pessoas de experimentarem.
O que a universidade oferece, e não percebeu devidamente aquilo que oferece, é essa possibilidade enorme de fazer skunk works com riscos mínimos. Por alguma razão se nós olharmos para o mapa do MIT vemos centenas de empresas à volta, porque o MIT são os skunk works dessas empresas. As pessoas estão a ver, falham, mas num dado momento pode haver algo que é transformador.
Convivo num mundo em que tenho estudantes, ponho-os a experimentar e em alguns casos vejo “isto pode ser útil”. A dificuldade é que o tempo é enorme, o que nos obriga-nos a ter recursos para aguentarmos a distância de tempo entre a parte científica e o resultado tecnológico.

Há 20 anos as telecomunicações estavam no epicentro da economia. Entretanto foram substituídas pelas gigantes tecnológicas. Esta nova fase que estamos a viver, em que os gigantes tecnológicos dominam à escala global, é preocupante?

É completamente preocupante. E o que eu acho que a Europa tem feito é tentar regulamentá-la. Como europeu, devemos é procurar competir e ganhar. E eu acho que é possível competir e ganhar contra eles. Porque há formas de fazer crescer uma empresa de forma diferente, há modelos de empresa que eles não consideram. Temos muito a aprender com os vietcongues, como eles venceram o exército americano. É o foco no hiperlocal, são os sistemas de inovação, os sistemas organizacionais diferentes. O que eu acho é que nós devíamos competir com os americanos e com os chineses.
Não me sinto bem, como europeu, em pura e simplesmente estar a regulamentá-los numa posição defensiva e ser um parque temático. Há talento na Europa para competir, tem de haver riscos. Uma das coisas que me entusiasma imenso neste projeto é que nós temos essa hipótese. Estamos aqui para competir com eles e liquidá-los. Se nós conseguimos fazer isso no futebol, ser campeões europeus [risos] e ser uma potência conseguimos em tudo o resto.
Mas assusta-me, eu não aprecio ser servo e ter algoritmos que mandam em mim. I don’t like it (eu não gosto disso)! Portanto, a nossa ambição é competir e ganhar.

Do ponto de vista do trabalho com a YDreams no gaming e no esports, atualmente já se pode dizer que são áreas com importância em termos de mercado. Era o tempo que previa?

Era o tempo que previa. Houve vários percalços que atrasaram. Curiosamente, a antiga YDreams chama-se hoje YDX e está, através de uma política de aquisições baseada na bolsa, a criar uma cooperativa global em esports. O Brasil é fortíssimo em esports, e é de onde nós vimos originalmente. Temos vários parceiros, começámos a comprar e adquirir firmas e estamos neste modelo de cooperativa de empresas. Acho que o timming é completamente certo e há fenómenos inacreditáveis.
Por exemplo, agora comprámos uma academia onde os pais vão levar os filhos como se leva à academia do futebol e se prepara para uma carreira. Há bolsas de estudo hoje em dia para jogar esports pelas universidades americanas. É um mundo completamente diferente. Pessoalmente, isto não sou eu, isto é uma outra geração, é outro mundo, não me excita particularmente. Mas temos uma equipa onde todo o segmento jovem está completamente apostado nessa linha.
O que eu acho em relação aos jogos e ao storytelling é que me parece incrivelmente viciado. Umas das coisas que tentámos fazer na YDX em associação com a Disney foi procurar novas formas de histórias e temos um jogo à espera de ser lançado. E nessa área dos jogos há um ponto importante: o maior património da YDreams que vem do passado é uma tecnologia de jogos que nunca conseguimos implementar e esperamos implementar em breve, que é real time gaming, que é essa possibilidade de eu conduzir um carro virtual contra carros reais, em tempo real, por exemplo. E disso hoje estamos mais próximos e essa parte dos jogos interessa-me imenso porque há imensas aplicações possíveis, não só em jogos como em todas as outras áreas.

Há uma comparação que já ouvi várias vezes que é: a internet está para os nossos dias como esteve para outras épocas bem remotas a roda ou o fogo. Concorda?

Eu acho que sim, porque nos deu um acesso à informação que era impensável. Do ponto de vista do acesso à informação foi devastador. Há um tempo antes da internet, nomeadamente na universidade, onde tínhamos uma biblioteca miserável, e depois passámos a ter acesso ao mundo. E o impacto é enorme. Mas eu acho que a internet neste momento está numa mutação acelerada e não é nada claro que este acesso democratizado continue. Portanto há vários riscos que a internet vai atravessar seguramente. Mas tem uma importância gigantesca, tem um impacto enorme.

Vejo-o super entusiasmado com o novo projeto e tem uma carreira ímpar cheia de coisas que a maior parte de quem vem da academia hoje deseja. Mas também passou um mau bocado.

Um péssimo bocado.

Alguma vez sentiu que o mundo tinha sido injusto consigo?

Há várias formas de lidar com o fracasso. A pior de todas é ter pena de si próprio e eu nunca tive pena de mim próprio. Eu cometi erros e tenho de pagar por eles. E tenho de ter a esperança de que vou triunfar no final porque, se não, o que é que ando aqui a fazer? É óbvio que há pessoas que criticam e não sabem a história, mas isso faz parte. Qualquer pessoa que tenha o mínimo de notoriedade tem imediatamente pessoas que o odeiam sem nenhuma razão! E nós não nos podemos preocupar com isso. Aquilo com o qual me preocupei sempre é aquilo que me tem dado força, é que nós temos o valor, e temos de sair disto, temos de lutar, temos de ser resilientes. E se no final perdermos perdemos, acabou, tentámos tudo. Agora aquela coisa de ter pena de mim próprio não faz parte da minha personalidade, felizmente.