António Brandão de Vasconcelos: A Everis é “fruto do empreendedorismo” e quer ajudar startups
Podia ser apenas uma consultora, mas é uma consultora fruto de empreendedores. António Brandão de Vasconcelos, chairman da Everis, diz que a história é simples de contar, porque se baseia num conjunto de pessoas que acreditaram que, mudando alguma coisa, podiam construir uma empresa de sucesso.
Então e o que mudaram? “Quisemos montar uma empresa que fosse boa, formada por gente boa e boa gente. Uma coisa tão simples quanto isto. São princípios muito simples mas que têm uma data de derivados. Por exemplo, se é uma empresa para gente boa, significa que temos de ser a melhor empresa para os melhores profissionais: para isso há que tomar um conjunto de decisões. Se queremos boa gente, então também temos de ter um papel na sociedade e não vamos permitir internamente que as pessoas subam à conta de outros, se empurrem, sejam egoístas ou não partilhem… Toda a orgânica, toda a forma como decidimos a companhia tem a ver com estes princípios: gente boa e boa gente. Tem corrido muito bem”, começa por contar.
Há 18 anos, quando surgiu a Everis, como “fruto do empreendedorismo” e premiando ideias de empreendedorismo e inovação, talvez tudo parecesse fora de tempo. Mas a Everis é isto: são empreendedores porque lhes está no ADN e espelham isso mesmo em cada coisa que fazem. “O prémio que criámos é monetariamente muito relevante: estamos a falar de 60 mil euros sem qualquer compromisso. Acho isso diferencial. Não exigimos nada. E não são 60 mil em serviços, são 60 mil em cheque”, explica o chairman.
Olhando para os premiados dos últimos cinco anos, Portugal tem lugar bem marcado. Dois vencedores, duas menções honrosas. “Talvez seja representativo do que está a ser feito em Portugal. A qualidade das pessoas que atualmente saem das universidades e que algumas passam para investigação é de facto excecional. No prémio, em termos de júri, há vários filtros e o júri final é constituído por gente muito conhecida no meio académico, no meio empresarial, etc. Estrangeiros, quase todos ou todos. Há um português ou dois, mas praticamente todos fora de Portugal”.
A qualidade dos projetos começa já a ser inegável. No prémio da Everis, as menções honrosas não existem todos os anos. Não há obrigatoriedade em atribui-las. Nas duas que couberam a Portugal, o que se passou foi “haver uma segunda empresa que não ganhou por pouco”. Aqui, o que ressalta é a qualidade, diz António Brandão de Vasconcelos. “Na qualidade do projeto em si, ou seja, do que é que se conseguiu investigar, e na capacidade empreendedora das pessoas, a vontade de saltarem e conquistarem o mundo e terem uma solução para problemas. Impressiona muito”.
Mas que problemas tentam os portugueses resolver? Em que é que somos premiados? No último ano, o prémio da Everis foi para “um projeto que consegue, através de terapia celular, resolver o problema das feridas que normalmente os diabéticos têm. E uma empresa encontrou uma solução para resolver isso. Ainda é preciso fazer testes, enfim… São percursos compridos e exigentes em termos financeiros, mas a solução parece excelente”, explica António Brandão de Vasconcelos.
Contudo, fala-se de projetos exigentes, trabalhosos, porque demoram até chegar a uma situação de validação do mercado, de modo a terem retorno. Pode Portugal apoiar projetos nestas circunstância? Para o chairman da Everis a resposta é evidente. “Não temos muita paciência nem temos muito dinheiro. Até estes projetos chegarem ao mercado são oito anos, ao passo que um site são 15 dias… Há uma certa diferença e não sei se há muito dinheiro e muita paciência para aguentar isto. Mas digo paciência no sentido de se aceitarem resultados daqui a uns anos. Essa é a questão. Quando se exigem milhões de euros para testes clínicos, para isto, para aquilo e para aqueloutro, nunca se sabe se na véspera de se terminar todo este processo há outra empresa, noutro país, que resolve o mesmo problema de outra forma. E de repente aqueles milhões que foram gastos este tempo todo não servem para nada, porque se perdeu a oportunidade”, explica.
Apesar destes possíveis percalços pelo caminho, o facto é que todo o percurso que se faz é sempre utilizável para quem desenvolve o projeto. Mas o problema é outro: “para quem pôs ali milhões não lhe compensa”.
Se ideias há muitas, nem todas elas resultam da mesma forma. O que faz a diferença? Quem atinge o êxito e porquê? As perguntas são muitas, mas as respostas tardam em surgir. Ou, pelo menos, tardam em ser concisas.
“Acho que era interessante analisar isto, porquê que há milhares de empresas, de startups em todo o mundo, que lançam novas redes sociais, por aquilo ou por aqueloutro, mais para a esquerda ou mais para a direita. Porquê que o Snapchat teve o êxito que teve? Porque apagava o vídeo? Só por isso? Este caso é engraçado. De repente a juventude só quer aquele. Porquê? O Whatsapp… Quantas coisas apareceram antes? Milhares! Centenas, milhares de chats. Porquê que o Whatsapp teve êxito e outros não?”, questiona António.
E as pessoas que estão à frente dos projetos fazem a diferença? Sim, claro que sim. “Mas será só isso? Será sorte? A sorte dá muito trabalho”, diz entre risos.
A única certeza é o mundo mudar a uma velocidade estonteante. O tecido empresarial mudou, as pessoas querem arriscar em projetos novos, seus. E para isso é preciso ter os olhos postos no futuro. “A cidade está toda a mudar, a expansão digital está na ordem do dia, todos os dias se fala nisso, vai mudar isto e aquilo. O emprego vai mudar, as pessoas vão passar a ser a sua própria empresa. Tudo isto está a mudar e o nascimento de startups vai nesta onda também. Portugal faz a diferença porque tem pessoas com uma excelente formação de certas universidades. É genérico. Nós somos uma multinacional, trabalhamos com muitos países, temos portugueses a trabalhar em muitos sítios e os elogios que recebemos de portugueses que vão para projetos lá fora é brutal. Neste momento temos imensa gente em Londres porque adoram os portugueses, têm muita capacidade, muita qualidade no que fazem”, ressalta António Brandão de Vasconcelos.
O profissionalismo dos portugueses vem, para o chairman da Everis, da formação que passou a ser dada nas universidades, que fizeram nascer um novo ecossistema neste meio. “Há muita gente a fazer coisas muito bem feitas”.
Neste sentido, é preciso aproximar as pessoas que “sabem fazer” das grandes empresas. Para isso, a Everis pensou num projeto, o Link up, que pretende trazer startups para junto das empresas: numa primeira fase para dentro da Everis e depois para o seu círculo de clientes.
“Eu acho que é um projeto muito engraçado. A ideia é encontrar startups desenvolvidas ou a desenvolver-se que possam corresponder às futuras necessidades ou às ideias dos nossos clientes. Nós temos um grande conhecimento do que os nossos clientes pretendem. Para onde é que vão, que tipo de ideias é que necessitam".
A seleção seguiu um método simples. “Olhámos para 280 ou 290 startups e vimos as que tinham alguma potencialidade de ter algum interesse para nós, juntámos os nossos diretores com uma escolha inicial de 50 e tal startups, dessas foram escolhidas 17 e com essas vamos trabalhar para ajustar o que elas têm às necessidades. E estão muito entusiasmadas! Vamos apostar no que nós sabemos do mercado para ajustar. Se conseguirmos, se houver alguns resultados, o que pretendemos é ajudar essas startups a escalar internacionalmente, aproveitando a nossa rede. Nós, só em termos de Everis, estamos presentes em cerca de 16 países, e se considerarmos a nossa casa-mãe, a MTT Data, estamos em 50 ou 60. Temos um mercado brutal para as ajudar a internacionalizar-se com o nosso apoio. Isto é óptimo para elas e para nós, porque lhe vamos ensinando alguma coisas e os jovens empreendedores destas startups também nos vão seguramente ajudar e ensinar a olhar para os problemas. Vão mostrar-nos como encarar novas soluções, como ser imaginativos. Isso é bom para todos”, diz.
Esta é, de momento, a grande ideia da Everis: “ajudar um conjunto de startups a conseguir a internacionalização”. Mas quem tem ADN de empreendedor não fica por aqui. “É uma das nossas ideias. Gostamos muito de ajudar o empreendedorismo social, que também precisa de uma arrumação. No mundo das startups já foi feita muita coisa, há muita gente no mundo da inovação social onde também é preciso fazer coisas e temos ideias aí”, remata.