Voltar | Inteligência Artificial

A IA cria piores alunos?

por Marta Amaral | 11 de Setembro, 2025

Milhares de alunos preparam-se para voltar às salas de aula para um novo ano letivo. Este ano, mais do que nunca, a inteligência artificial (IA) vai estar presente, e com chatbots cada vez mais desenvolvidos. 

Como será este regresso com mudanças tão rápidas? A IA no início das aulas é um risco ou uma oportunidade?

Ainda há uns dias, Johan Pehrson, ex-ministro da Educação da Suécia, afirmou que o país, considerado modelo por muitos, precisa de “regressar ao que é essencial”. Ao olhar para trás, Pehrson admite ter havido ingenuidade na digitalização da educação: “Fomos ingénuos. Estamos a voltar ao papel e à caneta”, disse, reconhecendo que nem todas as inovações trouxeram benefícios claros.

Entretanto, alertas sobre os riscos da IA multiplicam-se. A Meta anunciou alterações temporárias às suas políticas de chatbots de inteligência artificial para adolescentes, numa altura em que legisladores manifestam preocupações sobre segurança e conversas inapropriadas. A Common Sense Media, organização focada na segurança infantil, considerou recentemente os produtos Gemini do Google como de “alto risco” para crianças, devido à possibilidade de partilharem conteúdo inadequado ou darem conselhos de saúde mental questionáveis.

Apesar destes alertas, a opinião sobre o papel da IA na educação ainda precisa de maturar. Entre vantagens e desvantagens, a balança continua difícil de equilibrar.

“O futuro da educação é híbrido”

Para João Guimarães, CEO da Intuitivo, a IA representa uma oportunidade: “Vemos como uma forma de tornar a aprendizagem mais autónoma, sendo um excelente complemento ao trabalho com o professor”, explica um dos fundadores da EdTech, especializada em soluções digitais para o ensino.

Ao mesmo tempo, alerta para os riscos: “A preguiça existe se não houver orientação das escolas e professores. Devem existir regras claras que definam em que contextos a IA pode e deve ser usada, sem necessidade de proibição.”

O empreendedor sublinha que o maior desafio para os professores será adaptar os métodos de ensino e integrar a tecnologia nas aulas, enquanto para os alunos o desafio é não depender da IA, garantindo que o processo de aprendizagem continua ativo e pessoal. 

Apesar das preocupações, acredita que a digitalização da educação é inevitável, oferecendo vantagens como personalização do ensino, eficiência nos processos e maior autonomia para os estudantes. “É importante manter a componente humana, com o professor a desempenhar um papel essencial, mas em evolução. O futuro é híbrido, tirando partido do digital e do toque humano.”

Um irmão mais velho ou um colega de carteira? 

Para muitos estudantes, os chatbots já deixaram de ser novidade e tornaram-se rotina. Uns usam-nos para organizar tarefas, outros para escrever mensagens ou até para compreender melhor os próprios sentimentos. O regresso às aulas em 2025 acontece com uma geração que encara a IA como uma espécie de colega invisível sempre disponível.

Hévora Geovanna é estudante e descreve o chatbot quase como uma extensão de si mesma, usa esta ferramenta várias vezes ao dia, “para tudo”: organizar tarefas, escrever mensagens, até entender melhor o que sente.

No entanto defende que apesar da IA facilitar muito a organização, a pesquisa e até a escrita de trabalhos, entende que ao “depender demais dela”, corre o risco de perder parte da sua autenticidade como estudante (e indivíduo). Considera que a aprendizagem deixa de ser um processo pessoal e passa a ser terceirizada.

“É como um irmão mais velho muito inteligente, que sempre tem uma resposta pronta.” (Mas este “irmão” tem um lado sombrio): “Às vezes faz-me sentir pequena, como se eu não fosse capaz de pensar por conta própria. Acabo por me tornar mais preguiçosa, porque sei que ele resolve tudo depressa”, compara a jovem de 17 anos.

Alexandre Ferreira, da mesma idade, olhava para a IA com receio e por isso decidiu explorar a curiosidade. Depois de participar em várias iniciativas sobre IA, concluiu que a tecnologia é apenas mais um momento na história em que a humanidade se adapta a novidades inicialmente temidas. 

“No início havia muito receio. Um ano depois, percebi que não é o fim do mundo. A IA pode motivar, personalizar, dar feedback imediato e até incluir colegas com necessidades especiais”, afirma. Mas alerta: “Se for usada como substituto, diminui o espírito crítico e desvaloriza o esforço. O segredo é equilibrar.”

Alexandre considera ter testemunhado o decréscimo do “hype” do uso de plataformas como o ChatGPT, dado o número e a frequência de vezes que nos dá erros crassos e nos “denúncia”.

Rita Margarido apresenta uma visão mais conservadora, lembra que muitas etapas do percurso escolar exigem disciplina e resiliência, qualidades que nenhum chatbot consegue oferecer

“Devem ser restringidos ou até proibidos em contextos onde é preciso treinar a concentração. Caso contrário, corremos o risco de criar alunos dependentes de respostas instantâneas”, defende. 

A jovem de 16 anos usa a IA estritamente para o necessário e considera que a sua vida não depende desta ajuda. “Na minha perspetiva, funcionam como colegas de escola: capazes de dar respostas rápidas, mas nem sempre próximas da realidade ou capazes de estimular o pensamento crítico.”

Entre estas vozes emerge um ponto comum: os chatbots são ferramentas poderosas, mas o seu valor depende de como são usados. Podem ser irmãos digitais, colegas de turma ou assistentes invisíveis, mas nunca substituem o papel humano essencial na educação. A autonomia, a criatividade e o pensamento crítico continuam a depender de escolhas conscientes dos alunos.

No regresso às aulas, a geração de 2025 prepara-se para aprender, mais do que nunca, a dialogar com máquinas e consigo mesma. O desafio passa por ensinar a gerir a IA de forma “equilibrada”. Que lugar deve ocupar na nossa vida?