Para sempre 21?
É (foi?) uma marca adorada por teenagers do mundo inteiro – um mundo tão grande quanto as capitais onde abriu lojas e fez senhorios felizes, de Londres a Praga, Varsóvia, Bucareste, Rio de Janeiro, Beirute, Tóquio, Pequim, Manila, Cidade do Cabo, Sydney – e também Lisboa, claro. Houve festas animadas, muitas fitas de inauguração cortadas e, no ponto mais alto da sua história, receitas de 4 mil milhões de dólares.
Era assim a Forever 21 e foi assim que se tornou uma espécie de coqueluche para muitos espaços comerciais que sabiam que era garantia de casa cheia.
Hoje sabe-se que desde 2016, ano em que a marca detinha 522 lojas nos Estados Unidos, e mais de 200 noutros 43 países, que havia problemas. Nesse ano, o fundador – Won Chang, que em 1984 fundou a marca com a mulher após ter chegado aos EUA vindo da Coreia do Sul – teve de emprestar dinheiro à empresa, e as duas filhas do casal Chang, também elas executivas da marca também abriram os cordões à bolsa. Outro empréstimo de 18 milhões de dólares foi feito a uma empresa filipina e, no início de 2019, a Forever 21 vendeu a sua sede em Los Angeles bem como o centro de distribuição por 166 milhões de dólares. No verão estava sem dinheiro.
A falência chegou em setembro de 2019 e a marca fechou operações no Canadá e na Europa, encolheu na Ásia e na América Latina – num total de 350 encerramentos entre 800 pontos de venda espalhados pelo mundo. Anunciou também o fecho de 178 lojas nos Estados Unidos. Agora os donos de centros comerciais no mercado americano pretendem manter as lojas – ainda que em menos número – e sobretudo querem que os Chang deixem de ter o controlo de gestão. Senão o futuro da marca pode estar mesmo condenado.
Quando a marca foi criada era vista no mercado como uma alternativa fresca e barata à GAP – uma marca com aspiracional e de preço mais elevado. Mas isso foi antes de insígnias como a Zara e a H&M chegarem ao mercado americano; no movimento inverso, quando a Forever 21 chegou à Europa, uma competidora de baixo preço como a Primark já estava bem instalada – apesar de nunca ter gozado do mesmo sex-appeal.
Além das mudanças no xadrez do mercado, também os consumidores mudaram. A fast fashion é cada vez menos bem vista – comprar roupas descartáveis significa pouco ou nada para a geração que preza antes de mais identidade e, além disso, há uma nova variável chamada consciência ambiental.
O casal Chang, os amigos e as filhas
A relação do casal Chang é, ela própria, singular. Raramente são vistos juntos e cada um conta com a ajuda de um membro de outro casal – Alex e SeongEun Kim Ok, também oriundos da Coreia do Sul e que se tornaram, nos anos 90, grandes fornecedores de roupa da Forever 21. Em 2002, os Chang convidaram Alex para ser sócio da empresa com uma participação de 1% apenas, mas com o lugar de presidente. Seis anos mais tarde, em 2008, SeongEun foi trabalhar com Jin Sook, mulher de Won Chang e também fundadora da marca. A relação era tão chegada que os dois casais passaram a viver próximos, em Beverly Hills.
Em 2009, mais duas pessoas juntaram-se ao grupo restrito de decisão da Forever 21: Linda e Esther, as duas filhas do casal Chang, ambas com formação em gestão ocupando duas vice-presidências.
O segredo da Forever 21 enquanto marca de moda passou sempre por ser rápida a ler as tendências e ágil colocar no mercado peças apetecíveis a um preço competitivo. A Bloomberg descreve-a como sendo a marca daquela peça que vemos num desfile de moda, num blog ou no Instagram e que depois encontramos numa versão barata na Forever 21. As lojas tinham roupa nova quase todos os dias e a marca não procurou ter uma boa loja online – o que acabou por ser mau para o negócio, mas foi bom para os centros comerciais enquanto durou.
Sobre a roupa da marca também é preciso contar mais qualquer coisa. O propósito era ter peças que refletissem as tendências de moda – mas não que fossem uma réplica exata. Nos últimos 20 anos, estilistas como Diane von Furstenberg, Anna Sui e Gucci colocaram mais de 250 processos em tribunal acusando a Forever 21 de roubo de propriedade intelectual. Muitos foram resolvidos com acordos – e por acordos, leia-se, indemnizações de compensação. Outros continuam à espera de resolução – como é o caso do processo colocado pela cantora Ariana Grande que acusou a marca de a ter usado inadvertidamente na sua publicidade e que exige 10 milhões de dólares.
A informação na empresa era restrita ao casal e ao seu círculo mais próximo, das despesas à escolha de roupa. O círculo mais próximo era constituído pelo casal já referido, pelas filhas e por algum americanos-coreanos ou membros da igreja evangélica de que o casal fazia parte. Para se ter uma ideia de quão restrita era a equipa de gestão, conta também a Bloomberg que, no pique da expansão internacional, 20 pessoas em Los Angeles supervisionavam toda a operação.
Por outro lado, a empresa demonstrou sempre uma enorme apetência por lojas, tendo avançado com uma estratégia de compra de grandes espaços quando esse tipo de loja já estava em declínio na América. As imobiliárias vendiam-lhe, claro, mas rapidamente se percebeu que era difícil encher aquelas lojas e transformar espaço em receita.
A gestão de stocks e a previsão de vendas também parecia pouco racional. Os documentos revelados aquando do pedido de falência mostram movimentos erróneos, em que num ano foram feitas demasiadas encomendas, noutro menos do que necessário, o que segundo alguns executivos da empresa resultava do facto do casal Chang confiar mais nos seus instintos do que em projeções.
450 milhões de dólares de rendas por ano
Em março de 2019, a empresa contratou um novo CFO, Brad Sell, numa altura em que os relatórios de vendas já não deixavam qualquer margem para dúvidas sobre a urgência de controlar os danos. Ainda assim, os Chang tinham inaugurações de lojas planeadas – mas acabaram a fechar 100 por recomendação do novo responsável financeiro. Foram feitos acordos com fornecedores e com senhorios e também na Europa e na Ásia várias lojas foram fechadas. Entre o outono de 2018 e o outono de 2019, as operações da marca no Canadá, Europa e Ásia registaram perdas de 10 milhões de dólares por mês.
As rendas são um dos custos mais elevados da marca nos Estados Unidos: 450 milhões de dólares por ano, estando metade deste valor nas mãos de Simon e Brookfield, imobiliária de espaços comerciais. Num ano em que tantas lojas fecharam portas, o número, apesar de elevado, não deixava de ser uma base de negociação entre a Forever21 e os seus senhorios (que também não queriam ficar com dezenas de lojas vazias para as quais não há uma procura imediata). Essa via terá sido tentada e Simon e Brookfield mostraram interesse em fazer parte da solução. Como exigência impunham, no entanto, que os Chang se afastassem da gestão – o que não aconteceu e o acordo soçobrou.
A empresa contratou um novo COO e o tribunal impôs-lhe um Chief Restructuring Officer. Ao abrigo da lei de falência, a empresa goza de proteção de credores enquanto elabora um plano de reestruturação que terá de ser depois aprovado por eles. Se não for, o destino da marca pode ser o mesmo da Toys “R” Us.
Uma consulta à página da marca no Facebook permite perceber algum descontentamento entre os consumidores, seja por atrasos na entrega, seja pelo fecho das lojas ou por sites que deixaram de funcionar. Ainda assim, a marca continua a comunicar novidades e lançamentos em várias lojas.
Em Portugal, a marca abriu a sua primeira e única loja em Portugal em outubro de 2016, no Centro Comercial Colombo, em Lisboa.
Fevereiro é o mês para a marca apresentar a sua proposta de renascimento ao mercado.