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Matosinhos: a terra do mar é hoje um laboratório de economia azul

por Rute Sousa Vasco (Texto) | 11 de Agosto, 2025

Em Matosinhos, tudo aponta para o mar. A tradição da pesca, a tradição da indústria, nomeadamente conserveira, e agora também a biotecnologia, a robótica e a investigação científica associada ao mar.

Pode parecer um lugar comum, mas em Matosinhos é difícil que qualquer roteiro que sigamos não nos leve até ao mar. Os pretextos podem ser variados, desde a fileira de restaurantes aonde chega todos os dias “o melhor peixe do mundo” vindo diretamente do Porto de Leixões, às conserveiras que são símbolo da industrialização da cidade e, mais recentemente, à economia azul espelhada em pólos de inovação como o CIIMAR, UPTEC Mar, o INESC-TEC e o CeiiA e em mais de 70 startups que fazem parte do tecido económico e científico.

“Fazemos muitos processos de co-criação. Vamos junto das empresas, perguntamos quais são os problemas que têm e a partir daí criamos processos de investigação no laboratório que permitam resolver”, explica Vitor Vasconcelos, o professor e investigador que lidera o CIIMAR, criado no ano 2000 e com sede no Terminal de Cruzeiros do Porto de Leixões.

Tema mais de 600 investigadores de várias nacionalidades, um biobanco azul e projetos que vão do estudo de moléculas para o tratamento do cancro à utilização de novas formas de corar os têxteis. “Temos uma concentração de investigadores nas ciências do mar que não existe noutra região do país. E temos outra vantagem, colaboramos bem”, acrescenta o presidente do CIIMAR. 

A Inclita Seaweed Solutions é uma das empresas cuja investigação nasceu no CIIMAR e que está agora instalada no Polo Mar da UPTEC, outro dos hubs de inovação de Matosinhos. “Somos uma empresa de biotecnologia marinha e estamos a fazer a nossa entrada no mercado com o desenvolvimento de ingredientes com base em algas”, conta Catarina Ricca, business development manager da start-up e também ela investigadora.

“As algas são as campeãs da sustentabilidade, em termos de capacidade de produção de oxigénio superam a Amazónia. Podem ser usadas para quase todas as indústrias”, relata, sendo uma das utilizações a cosmética em que a Inclita Seaweed Solutions aposta agora com lançamento de uma nova linha de produtos.

A exploração do mar passa também pela utilização da tecnologia, nomeadamente no desenvolvimento de veículos capazes de perscrutar o oceano. O Tec4Sea é um dos projetos- âncora neste âmbito.

“O Tec4Sea foi o primeiro Tec4 do INESC-TEC, uma iniciativa para criar a ligação entre a academia e a indústria para o mar e a investigação do oceano”, afirma Carlos Almeida, investigador sénior que conduziu a equipa do The Next Big Idea na visitaguiada desde a marina de Leça, onde se encontrava a embarcação “Mar Profundo” que faz parte do projeto, às instalações onde são desenvolvidos os veículos robóticos. “Explorar o oceano com veículos robóticos torna tudo mais simples e mais rápida”, relata. É essa a premissa com que foi criada a ‘família’ Turtle que já vai até 4000 metros de profundidade, mas também a Eva e a Íris, robots batizados no feminino que asseguram variadíssimas explorações. 

Luís Madureira é um dos veteranos do polo mar da UPTEC – começou a investigação que daria origem à OceanScan em 2008, ainda bem o polo existia de forma autónoma. Hoje a empresa desenvolve veículos autónomos, ou seja, sem intervenção humana. “A nossa integração no Polo Mar da UPTEC acaba por ser de muita importância porque há aqui uma oportunidade de identificar problemas que podem ser resolvidos com as ferramentas que desenvolvemos”.

A convergência da investigação que é realizada no CIIMAR com a capacidade tecnológica de projetos como o Tec4Sea ou empresas como a OceanScan vai ser potenciada com a criação do Hub Azul que contempla uma bacia oceânica com 10 metros de profundidade e um poço que vai até aos 30 metros de profundidade que servirá para mergulho científico. Aqui vai ser possível um conjunto alargado de atividades desde testar estruturas de energia eólica ou de ondas e protótipos antes de irem para o oceano.

E porque estamos na cidade do peixe, o projeto Fish Matters traz uma nova perspetiva à fileira com a identificação de parceiros da academia e da indústria para uma nova utilização dos co-produtos de origem marinha – um dos projetos bandeira do B2E CoLAB. “Não são mais do que restos de pescado que não são utilizados ou que são utilizados para produtos de baixo valor acrescentado e que propomos possam ser usados com mais valor”, explica Maria Coelho, coordenadora do CoLAB.

Os números dimensionam a oportunidade: a biotecnologia azul é um mercado avaliado na Europa em 200 mil milhões até 2030 e Matosinhos quer estar nessa rota. A investigação é um caminho que já provou resultar: “Nos próximos 10 anos podemos serequiparados a um grande centro de investigação, por exemplo, nos EUA, porque a nível europeu já somos considerados um centro de topo”, sumariza Vítor Vasconcelos.