Afinal, a inteligência artificial é ou não boa para o ambiente?
por Miguel Magalhães (Texto) | 16 de Junho, 2025
No episódio mais recente da série sobre inteligência artificial do The Next Big Idea abordámos o tema da sustentabilidade, destacando os efeitos negativos de plataformas como o ChatGPT e os positivos, à boleia de duas startups portuguesas – a Omniflow e a Seedsight.
Um estudo recente publicado no MIT Technology Review revelou que a energia consumida por data centers nos EUA já é equivalente à consumida na Tailândia durante um ano inteiro. São 200 terawatt-horas de eletricidade, que podem não dizer nada ao utilizador comum, mas são mesmo muitas horas.
É um de vários números que vem sendo divulgado para demonstrar o impacto negativo que as tecnologias de inteligência artificial podem ter na sustentabilidade do planeta. Nos últimos anos, desde que as tecnologias de IA generativa entraram na nossa rotina, que vem surgindo cada vez mais dados (e reflexões) sobre o custo de tirar proveito de tecnologias que criam texto, imagem, áudio ou som do nada. Mais recentemente, o CEO da OpenAI, Sam Altman, revelou que só o número de pessoas que dizia “Olá” e “Obrigado” ao ChatGPT custavam vários milhões de dólares à empresa.
“[Estas tecnologias] tem um custo energético muito superior e, na maior parte das vezes, são utilizadas para fazer palhaçadas”, diz Pedro Ruão, CEO da startup portuguesa Omniflow, que produz um poste iluminação inteligente que é alimentado a energia solar e eólica. Mas há quem tenha uma perspetiva mais animadora face ao impacto das diferentes empresas tecnológicas que operam nesta área. “Elas próprias, conscientes de que isso pode ser a sua fragilidade, tem estratégias definidas para otimizar e reduzir os consumos”, afirma Cláudia Coelho, Partner da PwC.
O lado otimista
A inteligência artificial pode desempenhar um papel importante e bem medido em regiões e organizações que tenham na sustentabilidade uma das suas prioridades. Nos últimos anos, o termo vem aparecendo de forma cada vez mais regular nos relatórios de performance de várias empresas, mas nem sempre o que é dito acaba por se refletir em efeitos práticos do negócio.
Na Europa, a aposta forte em energias renováveis e o zelo face à aplicação de vários sistemas de IA, faz com que seja um terreno fértil para o aparecimento de várias startups capazes de trabalhar na insterseção de várias tecnologias com sustentabilidade, nomeadamente quando falamos de cidades inteligentes ou de diminuição de desperdício em indústrias com uma pegada de carbono maior.
O poste inteligente da Omniflow, por exemplo, além de iluminar permite a integração de um sistema, que através de sensores óticos conseguem reconhecer elementos como carros, pessoas e bicicletas, podendo ser utilizado por grandes infrestruturas para regular o trânsito e o estacionamento. “Se todas as cidades usassem o nosso poste, no caso de um apagão, todos os serviços continuariam a funcionar, e no dia-a-dia iriam consumir menos 90% do que estavam a consumir, e teriam um impacto muito grande do ponto de vista energético”, partilha Pedro Ruão.
Um pão mais sustentável
15%.
É quanto é desperdiçado na cadeia de valor indústria moageira, que transforma os cereais em farinha, que depois pode dar origem a vários produtos que fazem parte da nossa alimentação diária. A FAO, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, estima que anualmente são desperidaçadas 1,3 mil milhões de toneladas de alimentos que eram destinados ao consumo humano. É um problema grande no qual a inteligência artificial pode desempenhar um papel importante numa utilização mais eficiente dos recursos disponíveis. É precisamente isso que está a procurar fazer a startup portuguesa Seedsight.
Baseada no norte do país, a empresa liderada por Joana Paiva utiliza uma técnica sofisticada para recolher as propriedades biológicas de cereais como o trigo e o milho, para depois aplicar-lhes modelos de IA que permitem identificar um conjunto de padrões utéis à sua produção: a sua origem, os seus consumos energéticos e as condições onde podem ter uma maior produtividade. “Nós todos os dias ouvimos que até 2050, vamos ficar sem recursos suficiente e sem alimentos para alimentar toda a gente e a nossa solução acaba por casar muito bem com a sustentabilidade”, explica Joana Paiva.
O fim do greewashing
“A sustentabilidade não é um custo, não pode ser um custo e infelizmente ainda há empresas que olham para o tema dessa forma”, reforça Cláudia Coelho da PwC. Um dos benefícios da IA e das tecnologias complementares é a facilidade com que hoje vários indicadores-chave podem ser medidos e a maior dificuldade que muitas empresas enfrentam em afirmar que são sustentáveis, quando na realidade não o são.
Dessa forma, a inteligência artificial poderá obrigar a um maior rigor na forma de falar de várias temáticas ligadas ao impacto ambiental e criar quase como que uma competitividade positiva entre as próprias empresas: existem agora mais métricas de referência para o que significa ser sustentável e estão a ganhar cada vez mais relevância na forma como os mercados olham para o valor de vários de vários negócios.
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