O que são gémeos digitais, a tecnologia que está a transformar a indústria?
por Gabriel Lagoa | 9 de Junho, 2025
São réplicas virtuais de fábricas, máquinas ou cidades. Mas não são só desenhos 3D: os gémeos digitais usam inteligência artificial para prever falhas e melhorar operações em tempo real.
Nas fábricas, os erros custam tempo e dinheiro. Seja uma peça com defeito, uma máquina avariada ou um simples atraso na linha de produção, o resultado é quase sempre o mesmo: prejuízo. Mas há uma tecnologia que quer mudar isso. Chama-se gémeo digital (e apesar de soar a ficção científica, já está a ser usada em empresas portuguesas).
“Um gémeo digital é uma ferramenta muito poderosa. Antes dos gémeos digitais, uma fábrica não tem o controlo completo, tem parcial, porque há áreas que não conhece e por isso não mexe”, explica André Godinho Luz, CEO da Infinite Foundry, uma startup portuguesa que desenvolve esta tecnologia.
Na prática, um gémeo digital é uma réplica virtual de uma fábrica ou processo, construída com base em scans 3D, sensores e dados em tempo real. O objetivo? Simular o comportamento real de uma operação industrial e prever o que pode correr mal antes de acontecer.
“É simplesmente uma cópia fiel em 3D, em tempo real, da realidade”, descreve André Godinho Luz. “Eu, enquanto estou aqui a falar convosco, tenho o meu avatar a replicar o movimento dos meus lábios, das minhas mãos. Tenho no mundo virtual uma cópia fiel da realidade.”
A PwC tem acompanhado a aplicação destes modelos virtuais em contexto empresarial. Eduardo Barroso, Head of Emerging Technologies and Startup Ecosystem da consultora, lembra um caso concreto: “Uma fábrica tinha uma prensa que não funcionava como devia. Era difícil colocar sensores físicos. Com o gémeo digital, foi possível criar um sensor virtual numa réplica da prensa. E foi esse sensor digital que permitiu perceber o que é que não estava a correr bem.”
A partir daqui, as aplicações multiplicam-se. Miguel Fernandes, Partner da PwC, destaca a utilidade dos gémeos digitais na formação de novos colaboradores. “Posso fazer todo o treino e formação desse colaborador usando o gémeo digital. Combinando o gémeo digital com realidade aumentada, o trabalhador vai para o sítio e vê as instruções” à frente dos olhos, passo a passo, em tempo real.
É aqui que a tecnologia começa a sair dos ecrãs. Com a realidade aumentada, que através de uns óculos projeta elementos digitais sobre o que estamos a ver, podemos levar os gémeos digitais para o terreno, ou para chão de fábrica.
Segundo Eduardo Barroso, esta combinação tem efeitos práticos imediatos. “Quando um operador passa de montar a porta esquerda para a porta direita de um carro, é parecido, mas não é igual. [A pessoa] vai ter de ler o manual de instruções para se lembrar das diferenças que há de um lado para o outro. Utilizando os óculos de realidade aumentada, o manual de instruções passa a estar no nosso campo de visão.”
Mas afinal, o que torna tudo isto possível? A inteligência artificial. É o cérebro dos gémeos digitais”. É o que processa os dados recolhidos, possibilita simulações e sugere decisões.
Para André Godinho Luz, não estamos a falar apenas de algoritmos estatísticos. “A Inteligência Artificial não é só estatística. Pode ser física, pode ser química, pode ser biomecânica… e portanto, são estes algoritmos que utilizamos no gémeo digital para inferirmos novas situações, criarmos novas maneiras de fabricar.”
Na maioria dos casos, as empresas começam com um problema concreto, como uma quebra de qualidade, por exemplo, e implementam o gémeo digital numa área crítica. “Testa-se o impacto, mede-se o retorno e só depois se avança para o resto”, diz André.
O futuro? Passa por muito mais do que fábricas. Eduardo Barroso antecipa aplicações em cidades inteligentes, gestão de tráfego, qualidade do ar e saúde. O CEO da Infinite Foundry vai mais longe e considera que os gémeos digitais são a fundação, acrescentando que são eles que vão ligar os sistemas de superinteligência como o ChatGPT ao mundo real. Vão trabalhar em conjunto e resolver problemas grandes: da energia à saúde.
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