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Byju’s. De 22 mil milhões de dólares à insolvência

por Gabriel Lagoa | 19 de Julho, 2024

A justiça da Índia iniciou um processo de insolvência contra aquela que já foi a maior startup do país. No seu auge, a plataforma de edtech apoiava 120 milhões de estudantes.

A Byju’s, uma startup de tecnologia educativa (edtech) indiana, está a enfrentar um processo de insolvência, numa autêntica reviravolta para uma empresa que há apenas dois anos estava avaliada em 22 mil milhões de dólares (cerca de 20 mil milhões de euros). As dificuldades não são recentes, mas culminaram esta terça-feira com um tribunal da Índia a iniciar o processo de insolvência contra a Byju’s, em resposta a uma petição do Conselho de Controlo do Críquete na Índia (BCCI na sigla em inglês), que procura recuperar cerca de 19 milhões de dólares da startup de edtech. A Byju’s tinha anteriormente patrocinado a seleção de críquete indiana, um desporto muito popular no país. A justiça indiana nomeou também um responsável interino para gerir as operações da empresa, afastando assim o fundador, Byju Raveendran, do controlo operacional imediato

Em resposta, a Byju’s já anunciou que vai recorrer da decisão e afirma que procura uma audiência urgente sobre o assunto. A empresa acrescenta que deseja “chegar a um acordo amigável com o BCCI” e que os seus advogados estão a analisar o caso para tomar as medidas necessárias para proteger os interesses da startup.

Como conta o TechCrunch, a justiça do país convidou ainda credores, funcionários e fornecedores a apresentarem reclamações contra a empresa, sublinhando que “a existência de uma dívida e um incumprimento no pagamento da dívida está claramente estabelecida“. Esta situação marca o ponto mais baixo de uma longa série de crises que têm marcado a Byju’s nos últimos anos.

Byju’s: do sucesso à crise

A startup foi fundada em 2011 e tornou-se um nome de destaque no setor de edtech na Índia com o lançamento, em 2015, de uma aplicação que oferece vídeos interativos, jogos e questionários para ajudar os estudantes nas aulas e na preparação para os exames. Segundo dados da empresa, citados pela CNBC, a plataforma atingiu os dois milhões de downloads nos seus primeiros três meses. Em boa parte, pode dizer-se que a pandemia de COVID-19 foi crucial para o desempenho da Byju’s, dada a crescente procura por educação online na Índia, atualmente o país com maior número de habitantes no mundo, com mais de 1.400 milhões. 

De bolsos cheios, a Byju’s expandiu-se agressivamente e fez várias aquisições, incluindo a compra da Aakash Educational Services, uma empresa que se dedica à preparação de exames na Índia, por mais de 900 milhões de dólares em abril de 2021. No mesmo ano, a startup atraiu investidores de todos os cantos do mundo e fechou grandes rondas de financiamento, incluindo uma de 1.200 milhões de dólares (mais de 1.100 milhões de euros) em financiamento através de dívida, de acordo com a base de dados de empresas Crunchbase. Contas feitas, no seu auge, em 2022, a Byju’s apoiava 120 milhões de estudantes e tinha receitas equivalentes a 630 milhões de dólares (cerca de 577 milhões de euros). 

Em entrevista à CNBC, em novembro do ano passado, o cofundador da Byju’s, Divya Gokulnath, admitiu que a pandemia foi positiva para os cofres da empresa, “porque resolveu o desafio de as pessoas não saberem como a educação online pode ser parte da aprendizagem mainstream“. O responsável reconhece ainda que “a desvantagem foi que tivemos de crescer a um ritmo frenético. Tivemos de crescer para garantir que éramos capazes de satisfazer a procura”. 

No entanto, a pandemia não durou para sempre. Se a propagação do vírus que causa a COVID-19 trouxe lucros à Byju’s, o combate à doença acabou por contribuir para o declínio da empresa. Com o alívio das restrições e a reabertura das escolas, o ensino online desacelerou Byju’s teve de despedir pelo menos mil funcionários em junho do ano passado

No mesmo mês, segundo a Reuters, a consultora Deloitte e três membros do conselho de administração da Byju’s cortaram laços com a startup, numa altura em que surgiam dúvidas sobre a saúde financeira da empresa e as suas práticas de gestão. Escreve a agência de notícias que a consultora bateu com a porta devido ao atraso na apresentação de relatórios financeiros. Estas saídas levaram a um atraso de um ano na apresentação dos resultados financeiros de 2022, que se traduziram em prejuízos operacionais de mais de 290 milhões de dólares (cerca de 265 milhões de euros) para o negócio de ensino online. 

Mais: de acordo com a Bloomberg, a startup terá tido dificuldades em reembolsar um empréstimo de 1.200 milhões de dólares e também estará a ter problemas com os salários dos funcionários. Além disso, a empresa anunciou em janeiro que está a realizar um aumento de capital por subscrição de novas ações no valor de 200 milhões de dólares (cerca de 183 milhões de euros) para liquidar “passivos imediatos” e para outros custos operacionais.

Para os investidores, incluindo nomes como a BlackRock (a maior gestora de fundos de investimento do mundo), a Prosus (uma empresa de investimento em tecnologia), e a Chan Zuckerberg Initiative (do fundador do Facebook Mark Zuckerberg e da sua mulher) a situação é particularmente preocupante. No mês passado, a BlackRock, um investidor minoritário, reduziu o valor do seu investimento na empresa para zero. Semanas depois, seguiu-se a Prosus, um dos maiores investidores da Byju’s, que, ainda assim, espera que aquela foi outrora a startup mais valiosa da Índia possa ser recuperada.

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