A Disney quer ser como a Amazon?
por Miguel Magalhães (Texto) | 6 de Setembro, 2022
Duas empresas gigantes. Duas plataformas de streaming à procura de dominar o mundo dos filmes e das séries. Dois modelos de negócio distintos e duas formas distintas de usar o streaming do ponto de vista estratégico. No entanto, num futuro próximo, poderão ser mais as semelhanças do que as diferenças.
Não necessariamente, mais pode estar a querer tirar alguma inspiração do modelo de negócio da gigante do ecommerce.
Até há uns anos, as empresas não eram rivais em termos de negócio, dado que uma era líder no mundo do entretenimento (cinema, parques temáticos, merchandise) e a outra dominava não só o comércio online, como toda a infraestrutura tecnológica no qual a maior parte das plataformas digitais se baseiam através das suas soluções de cloud.
Mas agora já não é bem assim.
Nos últimos anos, a Amazon tem feito um esforço cada vez maior para tornar o seu serviço de subscrição Amazon Prime mais apelativo. O que começou com um serviço que dava descontos e maior flexibilidade de compra e entrega na sua plataforma de ecommerce é hoje também um mega ecossistema de benefícios e regalias numa área onde os consumidores parecem estar dispostos a gastar mais dinheiro: o entretenimento. Dá acesso aos serviços de streaming Prime Video e Amazon Music. Permite jogar uma série de videojogos e aproveitar descontos em “all-things gaming”. Deixa ler gratuitamente um conjunto de livros ou publicações incluídas na subscrição.
Se tivermos em conta os +200 milhões de subscritores atuais da Amazon Prime e a subscrição anual de 139 dólares, é um mega ecossistema que já vale praticamente 30 mil milhões de dólares ao ano. Para se colocar em perspetiva, é aquilo que a Netflix fatura num ano. E este valor nem inclui as receitas que a Amazon gera através das vendas na sua plataforma de ecommerce ou através da venda dos serviços da Amazon Web Services.
Por isso é normal que outras empresas, nomeadamente do setor do entretenimento, tirem notas.
O Prime Video como ponto de entrada
A Amazon tem investido para tornar o Prime Video num dos complementos mais atrativos da sua subscrição. Em abril de 2021, de acordo com a Amazon, das +200 milhões de pessoas que detinham uma subscrição Prime no mundo inteiro, 175 milhões tinham utilizado o serviço e as horas de visualização na plataforma tinham subido 70%, face ao ano anterior.
- Houve o maior investimento na produção de filmes e séries originais através da Amazon Studios.
- Houve, mais recentemente, a aquisição de propriedade intelectual com forte alcance como aconteceu com a compra da MGM ou dos direitos para a nova série de “Senhor dos Anéis”.
- Esta última ganhou especial notoriedade na semana passada, não só pela estreia de “Senhor dos Anéis: Os Anéis do Poder” no serviço de streaming, mas também por se tratar da série mais cara de sempre. Os +700 milhões de dólares envolvidos foram vistos como a maior ofensiva da Amazon numa guerra onde Netflix, Disney e HBO têm tido um papel mais ativo.
E, então, a Disney pôs-se a pensar
Em 1957, Walt Disney fez um diagram do modelo de negócio da Disney no qual mostrou como os seus filmes podiam gerar outras fontes de receita em merchandise, em bilhetes para parques temáticos e noutro tipo de publicações.
De acordo com o Wall Street Journal, sessenta anos mais tarde, a Disney parece estar a estudar um serviço de membership para tornar essas ligações mais oficiais. No final do segundo trimestre deste ano, o Disney+ ultrapassou os 150 milhões de subscritores e a empresa, que detém franchises como a Marvel e o Stars Wars, está a pensar como pode utilizar o serviço para criar uma oferta semelhante à Amazon Prime.
O CEO da Disney, Bob Chapek, não explicou ainda como é que um potencial “Disney Prime” se iria materializar, mas o objetivo principal parece ser centralizar a informação da utilização dos produtos Disney. Ou seja, conseguir perceber através deste programa para membros quando é que um fã Disney vai ao cinema, o que é que ele vê no Disney+, que merchandise é que compra na loja online da Disney ou quando é que vai à Disneyland. Desta forma, a Disney pode criar incentivos não só para extrair mais valor dos consumidores, mas a também atrair mais subscritores com base no comportamento dos atuais. Como? Algumas ideias:
- O “Disney Prime” pode incluir a oferta da Disney+ e descontos em todos os filmes Disney nas salas de cinema.
- Com o “Disney Prime”, o Disney+ pode passar a ter também uma área de ecommerce integrada com uma série de campanhas promocionais para subscritores.
- Por exemplo, depois de um utilizador fazer uma maratona de Star Wars no Disney+, o programa de membership consegue pôr o algoritmo a funcionar e recomendar uma série de “lightsabers” ao mesmo utilizador no dia seguinte.
- Com o “Disney Prime”, a Disney sabe exatamente o que viu nos cinemas e no Disney+ e oferecer descontos para a Disneyland Paris ou outra experiência Disney que mais se adeque ao seu perfil.
Porquê agora?
Há claramente uma questão de timing, ligada ao lançamento da série de “Senhor dos Aneís” por parte da Amazon, para marcar uma posição e mostrar que a Disney, enquanto organização, também está a pensar como pode evoluir.
Mas há também uma questão estrutural. O streaming é hoje um mercado ultra-competitivo, onde a “simples” produção e distribuição de séries e filmes já não é suficiente para um crescimento sustentável. Por isso, cada vez mais players procuram caminhos com outro tipo de integrações nas suas subscrições seja no gaming, em modelos suportados por publicidade ou no ecommerce.